A valva aórtica bicúspide é a doença cardíaca congênita mais frequente, com incidência estimada em 13/1000 nascimentos, sendo mais frequente no sexo masculino (75%). Muito além de um simples achado ecocardiográfico, esta condição frequentemente se associa a outras alterações estruturais e/ou funcionais do sistema cardiovascular.
De caráter hereditário e com penetrância variável, sua associação com aortopatias, bem como com alterações funcionais da valva aórtica já são bem documentadas, além de ser fator de risco para endocardite infecciosa.
CLASSIFICAÇÃO: melhor avaliada na janela paraesternal eixo curto durante a sístole ventricular (imagem B), as classificações da valva aórtica bicúspide baseiam-se na relação (localização da fusão e presença de rafes – imagem A) entre os folhetos acometidos.
A Classificação de Sievers é amplamente difundida e utilizada com frequência na prática clínica, dividindo a valva aórtica bicúspide em três diferentes tipos:
TIPO 0: ausência de rafe
TIPO 1: presença de apenas 01 rafe (tipo mais comum)
TIPO II: presença de 02 rafes
Existe, ainda, uma subclassificação (fenótipos) que leva em consideração o posicionamento da rafe em relação aos folhetos valvares: coronariano esquerdo (L), coronariano direito (R) ou não coronariano (N). A fusão entre o os folhetos coronariano direito e esquerdo (RL) é mais comumente documentada (80%), enquanto que a fusão do folheto coronariano direito com o não coronariano (RN) corresponde a aproximadamente 17% dos casos e entre o folheto coronariano esquerdo e o não coronariano (LN) a 2%.
Aspectos clínicos e evolutivos
É comum na prática clínica identificarmos uma valva aórtica bicúspide já associada a algum tipo de complicação, seja ela estrutural ou funcional, e quase sempre com uma evolução precoce – afinal, não é raro encontrarmos pacientes relativamente jovens com estenose aórtica importante, por exemplo, associada a valva aórtica bicúspide. Assim sendo, seguem alguns aspectos importantes relacionados a anatomia da valva aórtica e suas complicações:
- Sabe-se que os casos de valva aórtica bicúspide com fusão envolvendo o folheto não coronariano estão mais associados a estenose aórtica e aortopatias, sendo, portanto, um fator de risco estabelecido para estas condições;
- O tipo RL tem uma incidência aproximada de 66,2%, quando comparado com o tipo AP (46,2%) de estenose aórtica moderada a importante;
- O tipo AP está mais relacionado a regurgitação valvar quando comparado com o tipo RL (32,3% x 6,8%);
- Em estudo publicado no JACC, a relação entre valva aórtica bicúspide (comparando os tipos AP e RL) e aortopatia foi avaliada com os seguintes achados: ausência de doença de aorta foi mais comum no tipo AP (33,3%x 18,19%) enquanto que aortopatia classificada como tipo III (extensão de dilatação até o arco aórtico) foi mais comum no tipo RL (40,5% x 9,7%); já as aortopatias tipo I e II não tiveram diferença estatisticamente significativa entre os dois tipos na amostra avaliada.
Então, até aqui, ficou bem claro que, na presença de uma valva aórtica bicúspide, uma avaliação minuciosa da aorta torácica deve ser realizada com bastante cuidado. Por falar nisso, você lembra como avaliar corretamente todos os segmentos da aorta torácica através do ecocardiograma transtorácico? Opa! Um ótimo tema para uma próxima postagem, não acha? Até lá, então!
Referências
- Liu T. Bicuspid Aortic Valve: An Update in Morphology, Genetics, Biomarker, Complications, Imaging Diagnosis and Treatment. Front. Physiol., 30 January 2019 | https://doi.org/10.3389/fphys.2018.01921;
- Joon-Won Kang, Hae Geun Song, Dong Hyun Yang, Seunghee Baek, Dae-Hee Kim, Jong-Min Song, Duk-Hyun Kang, Tae-Hwan Lim, Jae-Kwan Song, Association Between Bicuspid Aortic Valve Phenotype and Patterns of Valvular Dysfunction and Bicuspid Aortopathy: Comprehensive Evaluation Using MDCT and Echocardiography, JACC: Cardiovascular Imaging, Volume 6, Issue 2, 2013, Pages 150-161, ISSN 1936-878X,https://doi.org/10.1016/j.jcmg.2012.11.007(http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S1936878X12009564)
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Graduado em medicina pela Universidade Potiguar (UnP). Possui residência em Clínica Médica, pelo Hospital Universitário Onofre Lopes – HUOL (UFRN), e em Cardiologia, pelo Procape – UPE. Porta o título de especialista em Cardiologia, pela Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC). E é pós-graduado em Ecocardiografia, pela ECOPE.
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