Os tumores cardíacos primários são raros e geralmente benignos. Em adultos, têm incidência estimada entre 0.2-0.4% e, dentro deste universo, os lipomas correspondem por cerca de 8%.
Em pacientes com idade inferior a 18 anos, por sua vez, são ainda mais incomuns, sendo os rabdomiomas e fibromas os tipos histológicos mais frequentes.
Esse tipo de tumor não tem predileção por sexo e, apesar de ocorrer em diferentes faixas etárias, é mais comum entre indivíduos mais velhos.
Normalmente são massas intracardíacas sésseis, com origem a partir da região subendocárdica (50%), podendo originarem-se da região subepicárdica (25%) ou miocárdica (25%). São mais comuns no átrio direito (42.4%) e, quando no ventrículo esquerdo (33.3%), podem ser encontrados em qualquer lugar desta cavidade.
Costumam ser assintomáticos, contudo, à depender do tamanho e localização, podem causar dor torácica, palpitações e até morte súbita por obstrução valvar ou de alguma artéria coronária.
À ecocardiografia, se caracterizam como uma massa homogênea (tecido adiposo), de contornos regulares e hiperecogênica, usualmente fixa ou com mínima mobilidade, dada a sua base mais alargada.
Apesar do ecocardiograma ser habitualmente o primeiro exame, este método tem atuação limitada na diferenciação com outras lesões tumorais e na determinação etiológica das massas intracardíacas. A ressonância magnética tem importante papel nesse contexto, sobretudo ao caracterizar o conteúdo lipídico desses tumores.
Por ser um tipo raro e com poucos relatos na literatura, não existe um consenso sobre com tratar esses pacientes. Em casos assintomáticos, o tratamento conservador com acompanhamento ecocardiográfico periódico pode ser opção. Já nos casos sintomáticos, a ressecção cirúrgica pode ser necessária.
A seguir, um caso ilustrativo de uma forma ainda mais incomum de apresentação de lipoma:
Menino, 14 anos de idade, realizou ecocardiograma para investigação de dor torácica atípica. Sem antecedentes patológicos ou histórico familiar de doença cardiovascular.
Ecocardiograma transtorácico demonstrou uma grande massa, fixa, hiperecogênica e homogênea no músculo papilar posteromedial, cuja a hipoecogenicidade habitual do tecido endocárdico não foi observada.
O músculo papilar anterolateral, por sua vez, tinha aparência habitual. O VE apresentava diâmetros normais e função sistólica preservada. Ademais, observado um refluxo mitral leve, com jato excêntrico.
Realizado, posteriormente, ressonância magnética cardíaca que confirmou tratar-se de tecido adiposo, favorecendo a hipótese de lipoma.
O grande diagnóstico diferencial fica entre a hipertrofia isolada do músculo papilar. Neste caso, atenção deve ser dada a diferença de ecogenicidade entre os dois músculos papilares: na hipertrofia isolada pode até haver uma mínima diferença, contudo o músculo papilar irá manter de forma predominante sua hipoecogênicidade; por outro lado, o lipoma apresenta hiperecogenicidade mais acentuada.
Graduado em medicina pela Universidade Potiguar (UnP). Possui residência em Clínica Médica, pelo Hospital Universitário Onofre Lopes – HUOL (UFRN), e em Cardiologia, pelo Procape – UPE. Porta o título de especialista em Cardiologia, pela Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC). E é pós-graduado em Ecocardiografia, pela ECOPE.