Na semana anterior falei aqui sobre uma condição cardíaca rara e com característica morfológica bem peculiar, a hipoplasia apical do ventrículo esquerdo. Para ilustrar, trago aqui um relato de caso retirado do periódico CASE com autoria brasileira.
Mulher, 66 anos de idade, com queixa de dispneia aos mínimos esforços há alguns meses. Previamente assintomática, tinha relato de infecção pelo SARS-CoV-2 três meses antes da admissão e era portadora de hipotireoidismo.
Ao exame, pressão arterial de 138×100 mmHg, FC 93 bpm e com presença de creptos basais em ambos os pulmões, edema de MMII e refluxo hepatojugular patológico.
Exames laboratoriais com BNP aumentado (795.9 pg/mL) e troponina normal. Radiografia de tórax com aumento da área cardíaca e congestão pulmonar, e eletrocardiograma com ritmo sinusal, sobrecarga atrial esquerda e de ventrículo esquerdo, além de alterações da repolarização ventricular.
Ecocardiograma demonstrou diâmetro diastólico do ventrículo esquerdo (VE) aumentado (65 mm) associado a um formato esférico desta cavidade, disfunção sistólica importante (FE 19%), E/e´ > 14 e dilatação atrial esquerda.
A região apical do VE se mostrava com ecogenicidade aumentada e acinética, bem como havia regurgitação mitral e tricúspide leves.
O diagnóstico inicial foi de insuficiência cardíaca (IC) com fração de ejeção reduzida secundário à cardiomiopatia dilatada. Iniciado, então, terapia medicamentosa para IC para, posteriormente, dar andamento ambulatorial ao caso.
Após 06 meses, novo ecocardiograma mostrou melhora da fração de ejeção (FE 43%), contudo houve dificuldade para delimitar, de forma acurada, a região apical do VE para quantificação volumétrica tanto na avaliação bidimensional quando na tridimensional.
Optado, então por realizar uma ressonância magnética (RM) cardíaca cujo resultado demonstrou um VE esférico e com disfunção sistólica leve (FE 45%), com a região apical truncada pelo abaulamento para a direita do septo interventricular.
O ventrículo direito, por sua vez, envolvia a região apical displásica e havia realce tardio, com padrão não isquêmico, no septo interventricular (F). Os músculos papilares apresentavam implantação apical e estavam aderidos a uma parede lateral hipertrabeculada.
A tomografia computadorizada (TC) identificou o mesmo formato do ventrículo esquerdo e documentou infiltração gordurosa na região apical (C e E). As artérias coronárias tinham origem habitual, porém a artéria descendente anterior era hipoplásica (D).
O diagnóstico final foi de hipoplasia apical isolada do ventrículo esquerdo e a paciente apresentou melhora sintomática significativa com a otimização do tratamento medicamentoso.
Graduado em medicina pela Universidade Potiguar (UnP). Possui residência em Clínica Médica pelo Hospital Universitário Onofre Lopes – HUOL (UFRN) e em Cardiologia pelo Procape – UPE. Porta o título de especialista em Cardiologia pela Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC) e é pós-graduado em Ecocardiografia, pela ECOPE.