A capacidade cardiovascular é um preditor independente e robusto de morbidade e mortalidade de todas as causa, bem como de mortalidade cardiovascular.
Ainda, na população idosa, é um marcador de perda capacidade funcional e independência, com um aumento de risco de dependência de 14% para cada queda de 1 ml/Kg/min de VO2 máximo.
Sabemos que vários fatores podem se relacionar com a diminuição do VO2 máximo, como por exemplo o envelhecimento e, sobretudo, o sedentarismo. De forma oposta, a atividade física regular tem a capacidade de aumentar o VO2 e, portanto, se associar a uma melhor capacidade cardiovascular e maior sobrevida.
Recentemente um fator que vem ganhando espaço como possível causa de baixa capacidade cardiovascular é o diâmetro ventricular. Esse fenótipo de “coração pequeno“, observado tanto em indivíduos saudáveis como em pacientes com neoplasia de mama e insuficiência cardíaca com fração de ejeção preservada (ICFEp) por exemplo, não seria capaz de aumentar o volume sistólico ejetado e o débito cardíaco durante o exercício o suficiente para contemplar as demandas metabólicas, uma vez que a fração de ejeção em repouso já estaria maximizada.
Trago aqui um estudo que objetivou avaliar a relação entre os diâmetros cavitários em repouso e o VO2 máximo em indivíduos com fração de ejeção (FE) preservada (> 50%).

Estudo observacional, multicêntrico, englobando participantes com diferentes espectros de capacidade funcional, partindo de pacientes com dispneia significativa até atletas competitivos.
Foram incluídos pacientes com (1) classe funcional II/III, (2) indivíduos saudáveis e (3) atletas de endurance. Os critérios para diagnóstico de ICFEp foram pontuação ≥ 5 no HFA-PEEF score ou ≥ 6 no H2FPEF score.
Além da análise ecocardiográfica em repouso, os participantes realizaram teste cardiopulmonar e o VO2 de pico < 18 ml/Kg/min ou um VO2 de pico absoluto < 1100 ml/min foram considerados os pontos de corte para incapacidade funcional.
Foram avaliados 2876 participantes, sendo 309 atletas de elite, 251 indivíduos saudáveis não atletas e 1969 pacientes com queixa de dispneia de origem ainda não determinada, além de 347 pacientes com ICEFEp.

A idade média foi de 64 anos (49% sexo feminino), com a FE do ventrículo esquerdo (VE) variando de 58% a 61% entre os grupos (mediana).
Entre os atletas, a média do volume diastólico final do VE foi de 159.3 ml (IQR 132.5-186.8 ml), com valor indexado médio de 83,0 ml/m² (IQR 69.0-94.0 ml/m²). Já entre os participantes com ICEFEp, esses valores foram de 88 ml (IQR 72-113.5 ml) e 47.4 ml/m² (IQR 38.8-57.6 ml/m²), respectivamente.
Os atletas mostraram a correlação mais forte entre o volume diastólico final do VE e o VO2 de pico (R² = 0.47, std β = 0.68, P < 0.0001).


Nas mulheres, a relação entre volume diastólico final do VE (absoluto e indexado) e o VO2 máximo foi mais fraca do que o observado entre os homens. Na análise multivariada, o volume diastólico final do VE, volume do átrio esquerdo indexado e E/e´ septal permaneceram como preditores de VO2 máximo em ambos os sexos.
A tabela 02 mostra a associação entre VO2, variáveis clínicas e variáveis ecocardiográficas, sendo a relação mais robusta, dentre as variáveis, observada com o volume diastólico final.

A relação entre essas variáveis (volume diastólico final e VO2 máximo) foi positiva, porém moderada (std β = 0.67, P < 0.001) e apenas uma relação fraca entre VO2 máximo e a fração de ejeção do VE (std β = – 0.16, P < 0.001) foi documentada. O volume diastólico final do VE explicou 45% da variabilidade do VO2 de pico.
Na análise multivariada com ajuste para idade, sexo e índice de massa corporal, as variáveis volume diastólico final, volume atrial esquerdo indexado e E/e´ septal permaneceram como preditores independentes de VO2 máximo (P < 0.001). Destes, o volume diastólico final apresentou a associação mais forte (std β = 0.30, P < 0.001), com a menor contribuição para o volume do átrio esquerdo indexado (std β = 0.18, P < 0.001) e para a relação E/e´ septal (std β = -0.13, P < 0.001).
Na análise multivariada para o status saudável/doença, o volume diastólico final do VE permaneceu como preditor independente de VO2 máximo nos grupos de atleta e de indivíduos saudáveis, mas não no grupo de pacientes com ICFEp.
A figura 03 demonstra como as medidas ecocardiográficas podem discriminar baixa ou boa capacidade cardiovascular.

O volume do VE se mostrou como forte preditor de capacidade cardiovascular tanto para o VO2 de pico ≥ 1100 ml/min (AUC 0.73, 95% IC: 0.71-0.75) quanto para VO2 de pico ≥ 18 ml/Kg/min (AUC 0.71, 95%IC: 0.69-0.73), sendo equivalente a relação E/e´ septal.
O ponto de corte do tamanho do VE para melhor predizer a capacidade cardiovascular foi de 88 ml para o volume diastólico final e de 57 ml/m² para a medida indexada.

A probabilidade de um VO2 abaixo do ponto considerado para independência funcional foi maior entre aqueles com VE pequenos e menor entre aqueles com maiores volumes do VE.
A probabilidade de se atingir VO2 máximo suficiente para boa capacidade cardiovascular foi de 83% naqueles com volume diastólico final do VE > 88 ml e de 72% naqueles com VO2 máximo > 57 ml/m².
Os achados, segundo os autores, reforçam a associação entre um tamanho pequeno do coração e baixa capacidade cardiovascular. Neste sentido, a análise de parâmetros ecocardiográficos com o VO2 de pico em indivíduos de diferentes espectros clínicos mostrou que o volume diastólico final do VE melhor se relacionou com o VO2 de pico, sendo o preditor ecocardiográfico mais forte.


Graduado em medicina pela Universidade Potiguar (UnP). Possui residência em Clínica Médica pelo Hospital Universitário Onofre Lopes – HUOL (UFRN) e em Cardiologia pelo Procape – UPE. Porta o título de especialista em Cardiologia pela Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC) e é pós-graduado em Ecocardiografia, pela ECOPE.