A presença de déficit contrátil segmentar é um achado associado a doença isquêmica, inclusive com impacto prognóstico, sendo uma parte fundamental da análise ecocardiográfica durante os testes provocativos, seja com estresse farmacológico ou físico.
É verdade, porém, que esta análise exige experiência do examinador e contempla um caráter subjetivo que pode gerar confusão diagnóstica quando na presença de outras anormalidades da contratilidade segmentar que não hipocinesia/acinesia/discinesia.
Uma dessas anormalidades que podem ser observadas durante o esforço e que, com frequência gera confusão diagnóstica, é o fenômeno do relaxamento segmentar precoce conhecido como SARP (segmental early relaxation phenomenon).

O SARP nada mais é que o relaxamento de algum segmento ventricular esquerdo ao final da sístole (após o pico sistólico e antes da abertura da valva mitral), ou seja, ocorrendo antes (de forma precoce) em relação aos demais segmentos, que irão apresentar um movimento para fora (relaxamento) apenas no início da diástole.

Outras nomenclaturas já foram utilizadas na literatura para descrever este fenômeno, como por exemplo “diastolic asinergy”, “late systolic bulge”, “preinflow relaxation” e “asynchronous relaxation”.
Este achado pode ser observado durante o repouso, mas é visto com frequência durante o esforço e sua presença não é indicativa de isquemia, não sendo, portanto, um achado de positividade na ecocardiografia com esforço.

Em um estudo com 244 pacientes submetidos a teste de esforço, seja com dobutamina ou estresse físico, por dor torácica (48%), rastreio de doença isquêmica (14%) ou por outras indicações (38%), a presença de SERP induzida pelo esforço foi observada em 29.1% dos exames.

Desses 71 pacientes, a presença de SERP foi documentada em mais de um segmento ventricular esquerdo em 35% dos casos e apenas 05 pacientes tinham o padrão de SERP em repouso, correspondendo a 2% da amostra.

O septo distal (região apical) foi a região mais comumente envolvida (49%) seguida do segmento médio do septo interventricular (20%). Dos pacientes com fração de ejeção < 40% (6), nenhum apresentou SERP.

Quando considerado o número total de segmentos com SERP (96 segmentos), apenas 5 (5.2%) apresentou padrão de alteração contrátil (isquemia) induzida por esforço. Por outro lado, 15 dos 71 pacientes com SERP apresentaram isquemia induzida pelo esforço em algum outro segmento que não o que apresentava SERP. Dos pacientes sem SERP (173), 55 (32%) tiveram teste positivo para isquemia.
Nesse estudo, 89% dos pacientes foram acompanhados durante um período de 29 ± 9 meses e apenas um único paciente faleceu (sepse). Não houve diferença estatística em relação a presença de eventos cardiovasculares entre os dois grupos (SERP x sem SERP).

Outro estudo avaliou a prevalência de SERP assincrônico (ASERP) em atletas de endurance de elite comparando com indivíduos saudáveis não atletas. Um total de 21 atletas (34 ± 10 anos de idade, 81% sexo masculino) e 11 controles (31 ± 10 anos de idade, 82% sexo masculino) realizaram eletrocardiograma, ecocardiograma, ergoespirometria e ecocardiograma com estresse físico.

Preventive Cardiology– Rehabilitation and Sports Cardiology, Sports Cardiology, Athle´s Heart
ASERP foi observada em 47.6% dos atletas e em 45.5% do grupo controle, com 70% dos atletas apresentando este fenômeno em mais de um segmento ventricular esquerdo. Considerando o número total de segmentos ventriculares avaliados, apenas 26 de 384 segmentos apresentaram ASERP, ocorrendo em 7.5% de todos os segmentos no grupo dos atletas e em 5.3% dos segmentos do grupo controle.


Preventive Cardiology– Rehabilitation and Sports Cardiology, Sports Cardiology, Athle´s Heart
O segmento septo apical e septo lateral foram os mais comumente envolvidos (58% e 19%, respectivamente). Os participantes com ASERP, atletas ou não, apresentaram maior prevalência de repolarização precoce no eletrocardiograma de repouso (73% x 24%, P = 0.012). Naqueles participantes com ASERP foram observados menores valores médios do strain rate diastólico na janela 4C e no strain rate diastólico na parede septo apical durante o repouso, além de valores maiores do strain rate diastólico após o esforço.
A presença de ASERP não teve impacto no VO2 máximo (p = 0.991).

Graduado em medicina pela Universidade Potiguar (UnP). Possui residência em Clínica Médica pelo Hospital Universitário Onofre Lopes – HUOL (UFRN) e em Cardiologia pelo Procape – UPE. Porta o título de especialista em Cardiologia pela Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC) e é pós-graduado em Ecocardiografia, pela ECOPE.