Novo Modelo de Quantificação Objetiva de Calcificação Valvar para Predizer Estenose Aórtica: a ecocardiografia transtorácica vai ganhar esses espaço? 

A estenose valvar aórtica (EAo) pode ser considerada um processo inflamatório degenerativo que culmina em fibrose, levando a espessamento, calcificação e redução de mobilidade dos folhetos valvares, resultando em obstrução progressiva do fluxo da via de saída do ventrículo esquerdo (VSVE) 

A ecocardiografia transtorácica bidimensional, por ser um exame acessível e não invasivo, é o carro chefe para o diagnóstico, graduação e acompanhamento deste tipo de alteração valvar. Através de uma avaliação multiparamétrica, com análise de parâmetros hemodinâmicos e anatômicos, este método desempenha papel importante na prática clínica. 

Contudo, alguns desses parâmetros são fluxo dependentes e podem variar de acordo com a angulação da insonação do Doppler, pela pós carga e até mesmo podem ter sua análise prejudicada por janelas acústicas limitadas. Desta forma, essas “limitações”, por vezes, podem resultar em análises discrepantes, levando a dúvidas quanto à gravidade da estenose valvar.  

Quando isso acontece, é comum recorremos a outros métodos complementares e, neste cenário, o escore de cálcio da valva aórtica pela tomografia computadorizada (TC) é uma importante ferramenta auxiliar, sobretudo para diferenciar estenoses moderadas das importantes.  

Para tentar auxiliar neste cenário em que a gravidade da EAo não pode ser definida com boa acurácia, Slostad et al. propôs um método simples de quantificação da calcificação da valva aórtica (VA), por análise da densidade de pixels usando um software específico (image J) com esse recurso, através da ecocardiografia transtorácica bidimensional. 

Neste estudo, 90 pacientes com suspeita de EAo severa foram avaliados, de forma retrospectiva, utilizando o método de avaliação da densidade de pixels para estimar a calcificação valvar aórtica e predizer a gravidade da EAo, comparando com os resultados obtidos através do escore de cálcio da VAo pela TC. 

Os critérios de inclusão foram a presença de pelo menos um dos seguintes parâmetros: 

  • Gradiente médio > ou = 40 mmHg;
  • Velocidade de pico transvalvar > ou = 4 m/s;
  • AVA < ou = 1 cm²;
  • Índice de Doppler < ou = 0.25;
  • Suspeita de EAo severa tipo low flow.

Além disso, uma boa janela acústica no plano paraesternal eixo curto, com visualização do anel valvar aórtico.  

A análise foi realizada no final da diástole, com a VA fechada, através do cálculo da razão entre a densidade média dos pixels da valva aórtica e do anel valvar (2D-AVC ratio – 2D Aortic Valve Calcium Ratio).   

O estudo demonstrou boa correlação entre 2D-AVC ratio e o escore de cálcio pela TC (r = 0.71, p < 0.001 –figura 2) e uma excelente acurácia em diferenciar EAo severa de EAo não severa (figura 3 – área abaixo da curva). 

O valor proposto de cutoff para predizer EAo severa foi 2D-AVC ratio de 0.96 (especificidade 89%, sensibilidade 89% – Figura 3). Esse parâmetro mostrou boa correlação com os parâmetros hemodinâmicos, tais como gradiente médio (r = 0.72, P < 0.001) e velocidade de pico (r = 0.74, p < 0.001), porém o mesmo não foi observado em relação à área valvar (r = -0.23, p = 0.03) e o índice de Doppler (r = -0.23, p = 0.04).  

Fui, por conta própria e seguindo a metodologia descrita no artigo, fazer análise de diferentes casos usando o mesmo software do estudo para tentar “sentir” como este novo modelo proposto pode ser usado na prática. Obviamente que minhas análises não devem ser utilizadas como parâmetros, uma vez que as fiz sem auxílio e, portanto, deve conter possíveis erros (rsrsrsrs). 

Paciente 86 anos, idosa frágil, assintomática, realizou ecocardiograma por sopro sistólico em foco aórtico. Apresentava VE com função sistólica levemente reduzida pela medida da fração de ejeção por Simpson (53%), porém com presença de insuficiência mitral importante funcional ( ou seja, superestimando a função ventricular esquerda) com dP/dt reduzido, além de insuficiência aórtica moderada.

Valva aórtica com calcificação importante dos folhetos e abertura valvar reduzida de forma significativa. Área valvar, pela equação de continuidade, de 0,98 cm2, contudo com parâmetros hemodinâmicos discordantes: velocidade de pico 2.83 m/s e gradiente médio 14 mmHg.

A análise do 2D-AVC Ratio foi sugestiva de EAo importante (lembrando-se de considerar todas as limitações possíveis dessas minhas medidas; este parâmetro obviamente não foi levado em consideração quando realizei o exame!).

Farei uma nova postagem, a seguir, com outro artigo recentemente publicado tentando aplicar esta medida na prática.  

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[…] TT), transesofágico (ECO TE) e através da análise por um software baseado em escala de cinza (ver esta postagem). Da mesma forma, durante o momento da cirurgia, o cirurgião cardíaco era questionado sobre a […]

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