ECOCARDIOGRAFIA DO ESPORTE: Análise Ecocardiográfica em Usuários de Esteroides Anabolizantes durante a fase “off-cycle”

A cardiotoxicidade induzida por esteroides anabolizantes (EA) vem, cada vez mais, sendo reconhecida como um importante dano colateral do uso supra fisiológico dessas substâncias.

Mais frequentemente temos vistos nos consultórios casos de cardiomiopatia induzida por EA, sendo o seu manejo bastante desafiador, seja pelo pouco conhecimento sobre tal condição ou pela dependência psicológica que essas substâncias causam em quem as usa.

Trago aqui uma publicação de 2023 que analisou usuários de EA durante a fase “off-cycle”, período no qual há interrupção do uso dessas substâncias. O objetivo era constatar se o dano miocárdico causado por esses hormônios seria persistente mesmo após sua suspensão.

S. Hammoud et al, International Journal of Cardiology 381 (2023) 153–160.

Foram avaliados 94 indivíduos do sexo masculino, divididos em três diferentes grupos: 1- sedentários (n = 15), fisiculturistas não usuários de EA (n = 26) e fisiculturistas usuários de EA e em “off-cycle” (n = 53).

Os participantes do estudo tinham entre 20-50 anos de idade e não apresentavam comorbidades metabólicas ou cardiovasculares.

Dentre o grupo de usuários de EA, o critério de inclusão foi ter histórico de uso crônico de EA em doses supra fisiológicas (média de uso prévio: 6.26 ± 5.47 anos), com pelo menos dois ciclos anuais e estarem em “off-cycle”pelo menos 01 mês antes do início das análises (média de tempo sem EA: 5.28 ± 4.52 meses).

Para comprovação do “off-cycle” foram realizados exames laboratoriais cujos valores de FSH, LH e testosterona deveriam estar dentro das faixas de normalidade.

A análise laboratorial também incluiu marcadores de injúria miocárdica e testes de coagulação. Os indivíduos do grupo de usuários de EA apresentaram maiores INR comparado com os fisiculturistas não usuários de EA (p = 0.005), bem como maiores expressões de D-dímero em relação aos outros dois grupos (p < 0.001). Tais achados indicam uma maior atividade pró coagulante.

S. Hammoud et al, International Journal of Cardiology 381 (2023) 153–160.

Em relação à avaliação cardíaca estrutural, foi documentado um aumento do diâmetro diastólico final do ventrículo esquerdo (DDVE) nos dois grupos de fisiculturistas em comparação com o grupo de sedentários (p = 0.003). O grupo de usuários de EA, por sua vez, apresentou aumento da espessura diastólica do septo interventricular em comparação com o grupo de fisiculturistas não usuários (p = 0.008).

O índice de massa ventricular foi maior entre usuários de EA em relação ao grupo de fisiculturistas não usuários (p < 0.001), contudo se mantendo ainda dentro do considerado normal (< ou igual a 115 g/m²).

Quanto aos parâmetros de função diastólica, o grupo de usuário de EA apresentou uma relação E/A menor (1.48 ± 0.25; p = 0.034) comparando com o grupo controle (1.55 ± 0.37) e o grupo de fisiculturistas não usuários (1.67 ± 0.32).

Não houve diferença em relação à fração de ejeção do ventrículo esquerdo entre os grupos.

O ventrículo direito de ambos os grupos de fisiculturistas apresentou diâmetro diastólico final maior que os indivíduos do grupo sedentário, mantendo em todos os grupos os parâmetros de funcionalidade preservados.

Fisiculturistas em “off-cycle” apresentaram, de forma persistente, redução do strain global longitudinal (SGL) do ventrículo esquerdo comparado com com os atletas sem histórico de uso de EA.

O valor médio do SGL no grupo de usuários de EA foi de 16.8%. Esta redução não foi restrita apenas aos atletas deste grupo que apresentavam remodelamento concêntrico do ventrículo esquerdo, ou seja, SGL reduzido também foi observado em indivíduos com a geometria cardíaca considerada dentro dos valores de normalidade.

S. Hammoud et al, International Journal of Cardiology 381 (2023) 153–160.

O padrão do SGL observado foi heterogêneo, com maiores valores nos segmentos apicais, à semelhança do que é visto em pacientes com amiloidose cardíaca (apical sparing).

S. Hammoud et al, International Journal of Cardiology 381 (2023) 153–160.
S. Hammoud et al, International Journal of Cardiology 381 (2023) 153–160.

Fica documentado, portanto, dano miocárdico induzido pelo uso de EA persistindo mesmo após a suspensão do uso suprafisiológico destas substâncias.

Outro fato interessante é que os parâmetros convencionais de análise ecocardiográfica pouco mudam nesta população, reforçando a necessidade de uso de técnicas avançadas para melhor entendimento desses pacientes.

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