A ecocardiografia com estresse é uma modalidade diagnóstica de bastante relevância, podendo ser sob a forma de estresse farmacológico ou físico. Apesar da modalidade farmacológica ser muito utilizada, sabemos que o estresse físico oferece uma resposta mais fisiológica e com menores taxas de complicações.
E quando falamos em estresse físico, temos duas possibilidades: esforço isotônico e esforço isométrico cujas respostas hemodinâmicas apresentam características distintas. O conhecimento dos mecanismos fisiológicos envolvidos nestes dois processos, portanto, é fundamental para a escolha correta da modalidade de estresse para cada perfil de paciente.
REGULAÇÃO DO FLUXO SANGUÍNEO NO MÚSCULO ESQUELÉTICO: durante o esforço físico, o fluxo sanguíneo pelo músculo esquelético pode aumentar 25-50 vezes, saindo de 3-4 ml/min/100g de músculo para 100-200 ml/min/100g.
Quando estamos em repouso, alguns capilares musculares tem pouco ou nenhum fluxo de sangue. Porém, durante o esforço físico intenso, todos os capilares se abrem e esse fenômeno diminui da distância pela qual o oxigênio e outros nutrientes devem se difundir dos capilares para as fibras musculares contráteis. Assim, a área de superfície capilar aumenta de 2-3 vezes.
O grande aumento de fluxo sanguíneo pelos músculos, por sua vez, resulta de mecanismos químicos que agem diretamente nas arteríolas dos músculos que estão sendo recrutados durante o esforço. Quando esses músculos estão ativados, há uma rápida utilização do oxigênio, diminuindo assim a concentração de O2 nos líquidos teciduais. Essa redução provoca vasodilatação arteriolar local em razão do aumento (compensatório) da liberação de substâncias vasodilatadoras.
REAJUSTES CIRCULATÓRIOS CORPORAIS DURANTE O EXERCÍCIO: ocorrem três efeitos principais durante o exercício que são essenciais para que o sistema circulatório consiga suprir o aumento da demanda de fluxo para os músculos: (1) descarga maciça do sistema nervoso simpático por todo o corpo, com consequentes efeitos estimulantes sobre toda a circulação; (2) aumento da pressão arterial; e (3) aumento do débito cardíaco.
No início do exercício, o centro vasomotor é estimulado a liberar uma descarga simpática maciça, enquanto que os sinais parassimpáticos para o coração são atenuados. Desta forma, 03 efeitos circulatórios são produzidos: (1) aumento considerável da frequência cardíaca e da força de bombeamento;
(2) Contração da maioria das arteríolas periféricas, exceto daquelas que estão nos leitos musculares recrutados (e que estão sob forte efeito vasodilatador muscular local). Desta forma, o coração é estimulado a suprir o fluxo sanguíneo aumentado que está sendo demandado pelos músculos, enquanto que, ao mesmo tempo, o fluxo sanguíneo pela maioria das áreas não musculares do corpo fica temporariamente reduzido, fazendo com que haja uma espécie de “sequestro”/redirecionamento de fluxo;
(3) As paredes musculares das veias e de outras áreas de capacitância da circulação são contraídas de forma muito potente, o que aumenta consideravelmente a pressão média do enchimento sistêmico. Esse é um dos fatores mais importantes na promoção do aumento do retorno venoso e, portanto, do débito cardíaco.
Um dos efeitos mais importantes da estimulação simpática aumentada durante o exercício é o de aumentar a pressão arterial. Isso resulta de efeitos estimulatórios múltiplos: vasoconstrição arteriolar e de pequenas artérias na maioria dos tecidos do corpo (exceto nos músculos ativos), atividade aumentada de bombeamento pelo coração e grande aumento da pressão de enchimento sistêmico.
EXERCÍCIO ISOTÔNICO x ISOMÉTRICO:
Durante o esforço isotônico temos um padrão de sobrecarga volumétrica. Isso ocorre pelo aumento significativo da pré-carga em razão do aumento do retorno venoso tanto pelos mecanismos há pouco citados, mas também pelo efeito da ativação da musculatura dos membros inferiores que atua como bomba por compressão mecânicas das veias facilitando retorno do sangue ao coração.
Além do aumento da pré-carga, o exercício isotônico tem como forte característica diminuição da resistência vascular periférica pela vasodilatação que ocorre no leito muscular que está sendo recrutado.
Já no esforço isométrico, o incremento do débito cardíaco é menor em relação ao que ocorre durante o esforço isotônico, uma vez que aqui há um aumento significativo da resistência vascular periférica, com níveis mais elevados de pressão arterial gerando uma sobrecarga pressórica. Com isso há uma redução mais acentuada da perfusão muscular (pela compressão mecânica do leito arterial), desencadeando um aumento extra da ativação simpática.
O ecocardiograma com estresse físico pode ser realizado utilizando uma bicicleta ergomêtrica (cicloergômetro) quando optado pelo esforço isotônico ou com a utilização de uma cadeira extensora ou manobra de handgrip com dinamômetro de mão para a modalidade isométrica.
No exame com esforço isométrico teremos uma resposta com predominância do aumento da pressão arterial – utilização de um menor grupo muscular (menor vasodilatação local) associado a uma resposta simpática maciça e acentuada pela redução da perfusão muscular (compressão do leito arterial) e aumento da frequência cardíaca em menor proporção.
Já no esforço isotônico, há maior retorno venoso, com incremento mais acentuado da frequência cardíaca em relação ao aumento da pressão arterial – recrutamento de grandes e numerosos grupos musculares, com maior território vascular sob vasodilatação, “compensando” em parte a resposta simpática durante o esforço físico.
Graduado em medicina pela Universidade Potiguar (UnP). Possui residência em Clínica Médica, pelo Hospital Universitário Onofre Lopes – HUOL (UFRN), e em Cardiologia, pelo Procape – UPE. Porta o título de especialista em Cardiologia, pela Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC). E é pós-graduado em Ecocardiografia, pela ECOPE.