Hoje nosso post abordará o passo a passo de como fazer a avaliação de dois parâmetros hemodinâmicos muito requisitados em pacientes críticos, frequentemente internados em unidades de terapia intensiva (UTIs) e com necessidade de ventilação mecânica: o cálculo do débito cardíaco e a responsividade à terapia de reposição volêmica. Vamos lá?
Cálculo do Débito Cardíaco
Para o cálculo do débito cardíaco, começamos medindo a via de saída do ventrículo esquerdo (considerada a região mais circular do ventrículo), na janela paraesternal em seu eixo longo.
Obtemos a imagem da via de saída em zoom, na mesossístole (aproximadamente na metade da parte ascendente da onda T no eletro, com as cúspides da valva aórtica abertas), medindo o diâmetro que vai desde a junção da cúspide coronariana direita com o septo interventricular até a junção da cúspide não coronariana com a cúspide anterior da valva mitral, como mostra a figura abaixo.
A partir deste diâmetro (D), é possível calcular a área da via de saída do ventrículo esquerdo (VSVE), utilizando a fórmula:
Área VSVE = πr²
- em que π=3,14 e r é o raio da VSVE, ou seja, metade do diâmetro medido (D/2):
Área VSVE = 3,14 x (D/2)²
- ou simplesmente:
Área VSVE = 0,785 x (D)²
A seguir, obtemos a integral de velocidade (VTI) da VSVE, na janela apical de “5 câmaras”, utilizando o Doppler pulsátil. Posicionamos o volume amostra imediatamente antes da valva aórtica (aproximadamente na mesma posição em que se mede a VSVE no eixo longo paraesternal) e tracejamos o contorno mais denso da curva obtida, como ilustrado abaixo.
Com estes dados (área da VSVE e VTI da VSVE), podemos calcular o volume ejetado (volume sistólico) em cada batimento cardíaco multiplicando os dois:
Volume sistólico = área da VSVE x VTI da VSVE
Agora, basta apenas que multipliquemos este volume sistólico pela frequência cardíaca (FC) do paciente para obtermos o débito cardíaco (DC):
DC = FC x volume sistólico
Avaliação da Responsividade à Reposição Volêmica
Podemos avaliar a responsividade à reposição volêmica utilizando dois parâmetros: a distensibilidade da veia cava inferior, no ecocardiograma transtorácico, e a colapsabilidade da veia cava superior, no ecocardiograma transesofágico. Pela praticidade e maior aplicabilidade, vamos discutir apenas a distensibilidade da veia cava inferior, que nada mais é que a capacidade de distensão da mesma.
Com valor preditivo positivo de 93% e valor preditivo negativo de 92%, o ponto de corte para a distensibilidade fica em 18%, ou seja, se a veia cava inferior apresentar distensão de mais de 18% da inspiração para a expiração, o paciente deve responder a reposição volêmica em 93% dos casos.
Como calculamos então este índice de distensibilidade (ID)?
ID = (Diâmetro máximo – Diâmetro mínimo) ÷ Diâmetro mínimo
A seguir, dois exemplos de pacientes reais:
Caso 1: Paciente em choque séptico e ventilação mecânica.
ID = (1,96-1,40) ÷ 1,40 = 40%, ou seja, tendência a boa resposta à reposição volêmica.
Caso 2: Paciente em choque séptico e ventilação mecânica.
ID = (1,21-1,17) ÷ 1,17 = 3,4%, ou seja, tendência a não resposta à reposição volêmica.
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Graduada em medicina, pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). É pós-graduada em Cardiologia, pela Funcordis, e em Ecocardiografia, pela ECOPE. Possui título de Especialista em Cardiologia, pela Sociedade Brasileira de Cardiologia.
Na descrição da formula do ID esta escrito como dividido pelo diâmetro mínimo e na conta da fórmula vc colocou o diâmetro maximo.
A fórmula está correta. Dividimos a diferença dos diâmetros pelo diâmetro mínimo, porque queremos calcular o capacidade de distensão que a VCI tem naquele momento, em relação ao diâmetro mínimo. No primeiro caso, a distensibilidade ficou em 40% e no segundo, em 3,4%.
Muito bom. objetivo!
Muito obrigada, professor!!! 🙂
Respondi a sua dúvida? Estou à disposição.
Ah vi agora. Foi um erro de digitação. Vou corrigir. Muito obrigada!
👍🏻
Se o paciente tiver uma cava inferior medindo 3,8 cm na expiração e 3,0 cm na inspiração.
ID: (3,8- 3.0) / 3,0 = 26%
Logo seria maior que 18%. Resposta positiva para volume. Porém a cava mede 3,8. Na prática faz ou não volume?
Olá, Julio! Quanto mais dilatada a cava, menores as chances de resposta à terapia volêmica. Mas neste exemplo que você utilizou, a distensibilidade da mesma nos mostra que ela ainda é capaz de absorver volume e, consequentemente, aumentar o débito cardíaco, que é o objetivo desta reposição. Portanto, seria cabível sim. Lembrando que, mesmo que seja superior a 18%, em até 7% dos pacientes, este índice falha. Respondi a sua pergunta? Mais alguma dúvida?
Muito obrigado!! E parabéns!
Muito obrigada!!! 🙂
Olá. Tenho uma dúvida. Na inspiração sabemos que a pressão intratorácica diminui e por isso o retorno pela veia cava fica facilitada, diminuindo o diâmetro da cava inferior na inspiração e aumentando na expiração.
Mas no paciente em ventilação mecânica a “inspiração” é através de pressão positiva para dentro do tórax, então o raciocínio não seria o inverso (na inspiração distende)?
Olá, Tayna!! Teoricamente sim. Por isso fazemos apenas a razão entre as diferenças dos diâmetros pelo diâmetro mínimo, pois o cálculo tem finalidade apenas de saber qual o grau de distensibilidade da VCI, seja em ventilação espontânea ou mecânica. Respondi a sua dúvida?
De acordo com o artigo original que mostrou sensibilidade e especificidade de 90% para o coeficiente de distensibilidade, seria o cálculo do índice de distensão maxima no final da inspiração para o o diametro minimo no final da expiração, se a cava distender mais da expiração para a inspiração significa fluidoresponsividade. Isso foi o meu entendimento
O diâmetro da VCI é máximo na inspiração e mínimo na expiração, pois na inspiração o aumento da pressão pleural leva um aumento na pressão intravascular do ATRIO DIREITO E CONSEQUENTEMENTE DA VCI, alem disso mais sangue para a cava porque no final da inspiração ocorre menor pre carga nas câmaras direitas devido a pressão positiva da VM.
Com isso…
O aumento do diâmetro da vci na inspiração. ESTE AUMENTO é ainda maior em casos de hipovolemia onde ela fica mais complacente.
Então avaliando o final da inspiração e final da expiração conseguimos avaliar que o aumento do coeficiente distensibilidade da VCI do final da EXPIRAÇÃO para a INSPIRAÇÃO ( maior que 18% ) significa que o paciente é fluidoresponsivividade
Sim, Renan! Quanto maior a distensibilidade da veia cava inferior (quanto maior o aumento de diâmetro da expiração para a inspiração), maior a responsividade a volume que este paciente terá. Lembrando que, em pacientes em ventilação mecânica, o mecanismo de expansão Torácica é diferente, pois é por pressão positiva. Portanto, na inspiração com pressão positiva, ao invés de haver distensão da veia cava inferior, existe uma redução de diâmetro.
🗡💀
Essa medida de distensibilidade de VCINFERIOR É VALIDA PARA PACIENTE EM VENTILAÇÃO ESPONTANEA ?
Sim, Augusto. Também é válida.
Olá, fiquei com uma dúvida. VTI da via de saída do ventrículo esquerdo é a mesma coisa que VTI do fluxo aórtico? Pq estava lendo alguns artigos em alguns mencionam na fórmula do volume sistólico utilizar VTI do fluxo aórtico e outros artigos mencionam VTI da VSVE. Você mencionou o VTI da VSVE. São sinônimos?
Olá!
VTI significa integral de velocidade. O fluxo de sangue tem velocidades diferentes, sendo a parte central mais rápida que a parte mais periférica, que sofre desaceleração ao sofrer atrito com as paredes dos vasos. A integral de velocidade é como se fosse a média de todas as velocidades. Assim a gente pode calcular o volume de sangue que passa num determinado ponto, multiplicando a integral de velocidade medida neste ponto pela área de secção deste ponto. O volume de sangue que passa pela via de saída do ventrículo esquerdo é o mesmo que passa através da valva aórtica. Mas as velocidades podem mudar (geralmente, através da valva aortica, a velocidade aumenta porque a área é menor do que a área da VSVE). Portanto, as integrais de velocidade destes dois pontos não são a mesma coisa. Mas se você quiser calcular o fluxo de sangue (o volume que passa a cada batimento), você pode utilizar qualquer uma das medidas: ou a VTI da VSVE multiplicada pela área da VSVE ou a VTI da valva aortica multiplicada pela área da valva aortica. Consegui explicar? Se não, me envie novo comentário.
Consegui entender sim, muito obrigado pela explicação.