Na conclusão da postagem anterior foram citadas algumas perspectivas futuras para o uso da ecocardiografia no contexto da amioloidose cardíaca. Dentre elas, a capacidade da avaliação pelo strain longitudinal (SL) do ventrículo esquerdo (VE) de predizer resposta terapêutica. Vamos, então, analisar o resultado deste estudo!
A pergunta do estudo foi: qual é o impacto do strain longitudinal e suas alterações após tratamento, dos pacientes com amiloidose AL e acometimento cardíaco, nos desfechos clínicos e sobrevida geral?
Muito utilizados para o acompanhamento dos pacientes com amiloidose cardíaca, a dosagem do NT pro-BNP e da troponina sabidamente tem limitações para avaliar resposta terapêutica nesse grupo de pacientes. Por exemplo, pacientes em hemodiálise podem apresentar níveis persistentemente elevados de NT pro-BNP apesar de evidências ecocardiográficas de regressão do acometimento cardíaco.
Assim, o estudo tentou avaliar o uso do SL como ferramenta para predizer resposta terapêutica. Foram avaliados 915 pacientes, entre 2010-2017, com diagnóstico histológico definido de amiloidose AL. O ecocardiograma com avaliação do SL (média de 6 segmentos do ventrículo esquerdo na janela apical 4C) foi realizado antes do início da quimioterapia e no seguimento com 12 e 24 meses após o início do tratamento. A regressão hematológica da doença foi definida pela ausência de proteínas monoclonais detectadas e normalização da relação das proteínas de cadeias leves.
69% dos pacientes avaliados tinham comprometimento cardíaco e foi observado piora do SL relacionada ao estágio da doença avaliado pelo cardiac mayo stage (p < 0.0001):
Da mesma forma, o sobrevida geral (definida aqui como o número de meses até que 50% dos pacientes evoluam com óbito) apresentou relação direta com os valores do SL (p < 0.0001):
Na análise das variáveis, o SL de base foi preditor de sobrevida independente das características dos pacientes (idade, sexo e função renal) e das comorbidades associadas (fibrilação atrial, diabetes, hipertensão arterial sistêmica, doença cardíaca isquêmica, disfunção valvar).
Nos 342 pacientes em que SL pode ser realizado antes do início da quimioterapia e realizado controle após 12 meses (225 pacientes morreram antes do controle de 12 meses e 19 pacientes tinham dados não interpretáveis ou perdidos), uma melhora de 2% do SL se associou com melhora da média de sobrevida (p < 0.0001). Uma melhora do SL e do NT pro-BNP também teve correlação com melhora da sobrevida quando comparada apenas com a melhora do NT pró-BNP (p < 0.0001).
Mudança no SL também teve correlação com a resposta hematológica ao tratamento quimioterápico, sendo observada piora do SL naqueles pacientes considerados como com resposta incompleta ao tratamento.
Com esses resultados, o estudo concluiu que o SL de base tem boa correlação com pior acometimento cardíaco, bem como pode ser usado como parâmetro para predizer sobrevida. Neste último caso, de forma independente das características dos pacientes e das doenças associadas.
Outros estudos corroboram essa informação. Lee Chuy et al., por exemplo, já demonstrou que o valor de strain de base desses pacientes se correlaciona, de forma superior a outros parâmetros ecocardiográficos (como fração de ejeção), com sobrevida.
Apesar de várias limitações (estudo não multicêntrico, a análise do strain apenas de 6 segmentos na janela apical 4C), estas informações trazem boas perspectivas para o uso desta ferramenta ecocardiográfica no acompanhamento destes pacientes. Outro estudo já correlacionou um SL > -14% com pior prognóstico. O grupo do Boston Medical Center, por sua vez, usa um cutoff de -10.2% para discriminar pacientes com piores desfechos.
Aqui, neste estudo, o SL médio dos pacientes que morreram nos 6 primeiros meses após o diagnóstico foi de -10.2%.
Além de confirmar a importância do SL no acometimento cardíaco da amiloidose AL, o estudo propõe (se validade em análises posteriores) uma nova classificação:
Graduado em medicina pela Universidade Potiguar (UnP). Possui residência em Clínica Médica, pelo Hospital Universitário Onofre Lopes – HUOL (UFRN), e em Cardiologia, pelo Procape – UPE. Porta o título de especialista em Cardiologia, pela Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC). E é pós-graduado em Ecocardiografia, pela ECOPE.