Trabalho de Conclusão de Curso: Endocardite Infecciosa de Valva Tricúspide – Relato de Caso

Vamos publicar aqui alguns dos trabalhos de conclusão de curso, adaptados ao formato deste blog, elaborados pelos alunos da nossa escola. Uma forma de prestigiar aqueles que são a razão da existência da ECOPE.

TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO: Endocardite Infecciosa de Valva Tricúspide

MODALIDADE: Relato de caso

AUTOR: Filipe Batista de Brito

ORIENTADOR: Dr. Jose María del Castillo

A endocardite infecciosa isolada da valva tricúspide (EIVT)  é um diagnóstico pouco frequente. No que se refere a incidência de endocardite infecciosa (EI), as de válvula tricúspide são responsáveis por cerca de 5% a 15% dos casos1. No intra-hospitalar a taxa de mortalidade de EI é de 15% a 20%2.

Nos últimos 30 anos, tem-se observado um aumento da prevalência de EI devido aos idosos com valvopatias degenerativas e ao aumento de infecções estafilocócicas4. No entanto, as infecções das valvas tricúspide e/ou pulmonar ocorrem mais em usuários de drogas endovenosas e como complicação relacionada à infecção de cateter vascular profundo5.

O ecocardiograma transtorácico (ETT) e o transesofágico (ETE) são de extrema importância para o diagnóstico, prognóstico, avaliação de complicações e para o seguimento dos pacientes com EI 5. Os critérios de Duke modificados são o padrão atual para diagnóstico, no qual é avaliado a presença de cultura para patógenos relacionados, novo sopro cardíaco no exame físico e alterações sugestivas no ecocardiograma transtorácico.

O presente relato descreve um caso de infecção por Staphilococos epidermidis em válvula tricúspide em uma paciente do sexo feminino, sem fatores de riscos prévios e evidencia a forma de transmissão por cateter utilizado durante o internamento hospitalar.

RELATO DE CASO:

Paciente do sexo feminino, 43 anos, internada em um hospital, da rede pública, para investigação de pancitopenia, sangramento uterino anormal e massa pélvica a esclarecer, sem comorbidades, negava internamentos prévios, tabagismo, etilismo e uso de drogas ilícitas. 

Durante a internação, após 3 semanas, cursou com dispneia súbita e foi diagnosticada com tromboembolismo pulmonar. Foi realizado o tratamento com anticoagulante, porém na 4ª semana evoluiu com rebaixamento do nível de consciência e em seguida foi intubada. Devido a mudança do aspecto do aspirado traqueal, foi solicitado a cultura, que evidenciou Pseudomonas aeruginosa, inicialmente tratada com Amicacina.

Evoluiu com redução da diurese e alteração da função renal não responsiva a medidas conservadoras, necessitando de hemodiálise durante 14 dias

Na evolução do quadro apresentou febre associada a sopro cardíaco panfocal, taquicardia e pressão arterial elevada. A hipótese diagnóstica era endocardite e por isso foi necessária a realização de uma ecocardiografia transtorácico, pela qual evidenciou-se uma massa aderida ao folheto tricúspide.

Para melhor visualização da referida alteração, foi realizada ecocardiografia transesofágica, em que foram evidenciados os seguintes achados: fração de ejeção (FE) de 48%, valva tricúspide com cúspide anterior apresentando imagem hiperecogênica com halo calcificado e sombra acústica posterior, aderida à face ventricular, medindo 20 mm x 16 mm, compatível com vegetação calcificada e gerando refluxo de grau importante (figuras 1 e 2). Também foi visualizado aneurisma de septo interatrial com forame oval pérvio, com aumento de câmaras direita e hipertensão pulmonar moderada (figuras 3 e 4).

A cultura de sangue evidenciou Staphilococcus epidermidis sensível à Vancomicina. Foi utilizada antibioticoterapia com Gentamicina por 14 dias, Polimixina B por 14 dias e Vancomicina por 41 dias. O tratamento não foi satisfatório e durante todo o período a paciente manteve-se com dispneia aos mínimos esforços, além de turgência de jugular e episódios de febre intermitentes. 

Na primeira avaliação da cirurgia cardíaca foi optado por tratamento conservador com antibióticos. Porém na segunda avaliação após o uso da antibioticoterapia não ter apresentado melhora foi indicada a cirurgia cardíaca de troca de valva tricúspide. A mesma foi realizada, sem intercorrências. E a paciente foi liberada para casa. Para realizar outras investigações do quadro ginecológico a posteriori. 

Trata-se de um relato de caso de uma endocardite de válvula tricúspide em uma paciente que não tinha hábitos toxifílicos, porém foi exposta a vários procedimentos invasivos durante o internamento. Essa condição, apesar de rara, pode ocorrer e a história clínica pode variar de acordo com o agente causal. Para o diagnóstico, além da história clínica, o ecocardiograma é o principal exame utilizado. O tratamento pode ser realizado com antimicrobianos e deve ser avaliada a necessidade de cirurgia ou não.

REFERÊNCIAS

1. Galal H, Rifaei O, Abdel Rahman M, El-Sayed H. Prevalence and characteristics of tricuspid valve endocarditis among patients presented to Ain Shams Hospital echocardiography lab; one year study. The Egyptian Heart Journal [Internet]. 2018 Jun 1;70(2):59–63. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC6112338/

2. Otto CM, Nishimura RA, Bonow RO, Carabello BA, Erwin JP, Gentile F, et al. 2020 ACC/AHA Guideline for the Management of Patients With Valvular Heart Disease: Executive Summary: A Report of the American College of Cardiology/American Heart Association Joint Committee on Clinical Practice Guidelines. Circulation. 2021 Feb 2;143(5).

3. Arnoni AS, Castro Neto J de, Arnoni RT, Almeida AFS de, Abdulmassih Neto C, Dinkhuysen JJ, et al. Endocardite infecciosa: 12 anos de tratamento cirúrgico. Brazilian Journal of Cardiovascular Surgery [Internet]. 2000 Dec 1 [cited 2022 Oct 1]; 15:308–19. Available from: https://www.scielo.br/j/rbccv/a/JLJHp8YRZb9FyXnLBfkhbMw/?lang=pt#

4. Pettersson GB, Hussain ST. Current AATS guidelines on surgical treatment of infective endocarditis. Annals of Cardiothoracic Surgery [Internet]. 2019 Nov 1;8(6):63044–644. Available from: https://www.annalscts.com/article/view/16669/html

 5.  Salgado ÂA, Lamas CC, Bóia MN. Endocardite infecciosa: o que mudou na última década? Revista Hospital Universitário Pedro Ernesto (TÍTULO NÃO-CORRENTE) [Internet]. 2013 Aug 20 [cited 2022 Oct 1];12(0). Available from: https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/revistahupe/article/view/7088

6. Araújo KRS, Reis ES, Cabral MRL. Ocorrência da endocardite infecciosa em usuários de drogas endovenosas. Research, Society and Development, 2021, 10(13):e1701011321108.

7. Habib G, Lancellotti P, Antunes MJ, Bongiorni MG, Casalta J-P, Del Zotti F, et al. 2015 ESC Guidelines for the management of infective endocarditis. European Heart Journal [Internet]. 2015 Aug 29;36(44):3075–128. Available from: https://academic.oup.com/eurheartj/article/36/44/3075/2293384

8. Otto M. Staphylococcal Biofilms. Current topics in microbiology and immunology [Internet]. 2008;322:207–28. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC2777538/

9. Rocha E, Figueiredo CF, Leite DS, Kalume LB da C, Castanheira M de C, de Assis SKJS, Guimarães MCM. As evidências no tratamento farmacológico da endocardite infecciosa: uma revisão de literatura. REAS [Internet]. 6nov.2020 [citado 1out.2022];12(11):e4464. Available from: https://acervomais.com.br/index.php/saude/article/view/4464

10. Sousa C, Pinto FJ. Endocardite Infecciosa: Ainda mais Desafios que Certezas. Arquivos Brasileiros de Cardiologia [Internet]. 2022 May 13; 118:976–88. Available from: https://www.scielo.br/j/abc/a/67QDmX46yz9WJ6zgqSdYsgK/

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