Strain do Átrio Esquerdo na Graduação da Disfunção Diastólica: revisão de artigo

Sabemos que diversos estudos mostram correlação entre a diminuição do strain longitudinal do átrio esquerdo (AE) na fase de reservatório (strain máximo) e o aumento das pressões do AE.

Cada vez mais a utilização deste recurso tem sido empregada no avaliação da função diastólica dos pacientes uma vez que o strain longitudinal do AE tem melhor correlação com eventos clínicos cardiovasculares quando comparado com os métodos volumétricos.

Trago aqui um artigo publicado em 2017 no JACC Cardiovascular Imaging que avaliou o strain do AE na quantificação do grau de disfunção diastólica do ventrículo esquerdo (VE).

Singh, A, Addetia, K, Maffessanti, F. et al. LA Strain for Categorization of LV Diastolic Dysfunction. J Am Coll Cardiol Img. 2017 Jul, 10 (7) 735–743.

Antes, porém, vamos relembrar as fases do AE durante o ciclo cardíaco:

  • Fase de Reservatório: ocorre durante a sístole ventricular, quando o AE está aumentando o seu volume até atingir o volume máximo no final da sístole. Corresponde à máxima deformação longitudinal e se inscreve acima da linha de base;
  • Fase de Conduto: inicia-se ao abrir a valva mitral e o sangue contido no AE entra rapidamente no VE durante o enchimento ventricular rápido. O volume do AE diminui, assim como a deformação longitudinal;
  • Fase de Bomba: corresponde à contração atrial e ocorre no final da diástole, diminuindo o volume do AE até o seu menor valor. Nessa fase, a deformação do AE atinge seu menor valor.
José M. del Castillo, Aplicações do Strain Cardíaco, Ecopeplay, 2024

Trata-se de um estudo retrospectivo, com pacientes submetidos a estudo ecocardiográfico entre janeiro de 2010 e maio de 2014. Os critério de inclusão foram (1) fração de ejeção do ventrículo esquerdo ≥ 50%, (2) ritmo sinusal e (3) ausência de doença valvar significativa (> que leve) ou prótese valvar.

Dos 90 pacientes avaliados, 15 apresentaram função diastólica normal e os demais foram divididos em grupos de acordo com o grau de disfunção (grau I, II e III) seguindo os critérios da diretriz da ASE 2009.

Singh, A, Addetia, K, Maffessanti, F. et al. LA Strain for Categorization of LV Diastolic Dysfunction. J Am Coll Cardiol Img. 2017 Jul, 10 (7) 735–743.

Função diastólica normal foi definida quando volume do AE < 34 ml/m², com e´ medial ≥ 8 m/s e e´ lateral ≥ 10 m/s. Quando estes três critérios estivessem alterados, dava-se o diagnóstico de disfunção diastólica.

Já a distinção entre os diferentes graus de disfunção diastólica foi obtida a partir da relação E/A, tempo de desaceleração da onda A, relação E/e´ média e o pico da pressão sistólica pulmonar.

Os pacientes com função diastólica normal eram significativamente mais jovens do que os pacientes com disfunção diastólica grau I e II (p < 0.01), sem haver diferenças entre pacientes masculinos e femininos. Enquanto que a fração de ejeção (FE) do VE, superfície corpórea, frequência cardíaca e pressão arterial sistólica foram similares entre os grupos, o índice de massa ventricular do VE demonstrou aumento progressivo com a piora da disfunção diastólica (p < 0.001).

O volume indexado do AE aumentou progressivamente à medida em que a disfunção diastólica (DD) progredia, sobretudo entre os grupos da DD grau I e II, não havendo diferenças significativas entre DD grau II e III.

Singh, A, Addetia, K, Maffessanti, F. et al. LA Strain for Categorization of LV Diastolic Dysfunction. J Am Coll Cardiol Img. 2017 Jul, 10 (7) 735–743.

Quanto aos parâmetros tradicionais de avaliação da função diastólica, a relação E/A, o tempo de desaceleração da onda A (TDA) e as ondas e´ septal e e´ lateral seguiram o padrão esperado com a piora da DD. A relação E/e´ média foi o único parâmetro convencional que permaneceu significativamente alterado, com aumento à medida em que a DD progredia, contudo perdendo significância quando entre os graus II e III de DD.

Indivíduos com qualquer grau de DD apresentaram valores maiores do volume do AE quando comparados com os pacientes sem disfunção diastólica. Quando utilizada a avaliação da função do AE pela análise volumétrica (isso foi possível em 80% dos participantes), observou-se que todas as 3 fases da função atrial foram afetadas com a piora do padrão de DD.

Singh, A, Addetia, K, Maffessanti, F. et al. LA Strain for Categorization of LV Diastolic Dysfunction. J Am Coll Cardiol Img. 2017 Jul, 10 (7) 735–743.

A função de reservatório, pela análise volumétrica, apresentou piora mais significativa entre os grupos de DD grau I e II comparados com o grupo controle. Da mesma forma, a função de conduto foi reduzida nos pacientes com qualquer grau de DD em relação aos indivíduos saudáveis. A função de bomba inicialmente aumentou na DD grau I, com redução posterior à medida em que o grau de disfunção piorou.

Singh, A, Addetia, K, Maffessanti, F. et al. LA Strain for Categorization of LV Diastolic Dysfunction. J Am Coll Cardiol Img. 2017 Jul, 10 (7) 735–743.

O strain de pico (fase de reservatório) do AE, por sua vez, apresentou um padrão linear de redução com a piora da DD, mantendo significância entre todos os 3 diferentes graus de disfunção. Houve excelente concordância entre avaliadores (inter-rater) em relação à medida do strain de pico do AE (r = 0.94).

Singh, A, Addetia, K, Maffessanti, F. et al. LA Strain for Categorization of LV Diastolic Dysfunction. J Am Coll Cardiol Img. 2017 Jul, 10 (7) 735–743.

Não foi observado uma forte correlação entre o strain de pico do AE com a velocidade do refluxo tricúspide, volume indexado do AE, velocidades das ondas e´ (septal ou lateral) e relação E/e´ média (r entre 0.17 e 0.41).

Singh, A, Addetia, K, Maffessanti, F. et al. LA Strain for Categorization of LV Diastolic Dysfunction. J Am Coll Cardiol Img. 2017 Jul, 10 (7) 735–743.

Entre os indivíduos que tiveram análise do strain longitudinal do VE realizada, houve diferença significativa entre o grupo controle e aqueles com disfunção diastólica grau III (-19±1% x -13±4%; p < 0.05), porém sem haver redução consistente nos graus I e II de DD.

Singh, A, Addetia, K, Maffessanti, F. et al. LA Strain for Categorization of LV Diastolic Dysfunction. J Am Coll Cardiol Img. 2017 Jul, 10 (7) 735–743.

Após análise dos dados, o strain de pico do AE apresentou AUC = 0.86 para a diferenciação do grau de disfunção diastólica do ventrículo esquerdo, refletindo uma performance diagnóstica excelente, segundo os autores.

Singh, A, Addetia, K, Maffessanti, F. et al. LA Strain for Categorization of LV Diastolic Dysfunction. J Am Coll Cardiol Img. 2017 Jul, 10 (7) 735–743.

Os valores de corte, obtidos no estudo, foram: 35% para grau I, 24% para grau II e 19% para grau III.

Singh, A, Addetia, K, Maffessanti, F. et al. LA Strain for Categorization of LV Diastolic Dysfunction. J Am Coll Cardiol Img. 2017 Jul, 10 (7) 735–743.

Quanto aos eventos clínicos (morte, hospitalização por insuficiência cardíaca), no grupo controle apenas 01 indivíduo (6%) apresentou evento clínico adverso, enquanto que nos indivíduos com DD, as menores taxas foram observadas no grupo com DD grau I (8%). No grupo com DD grau II foram documentados eventos adversos em 28% dos participantes e no grupo com DD grau III, 36%.

Os autores do estudo avaliam que os resultados vislumbram a possibilidade de análise de apenas um parâmetro (strain de pico do AE) para a graduação da disfunção diastólica, uma vez que apenas este parâmetro apresentou uma diminuição linear à medida em que há piora da disfunção diastólica comparado com os outros parâmetros convencionais de avaliação.

O strain de pico do AE, portanto, apresentou excelente acurácia diagnóstica, particularmente nos estágios mais avançados de DD, com o valor de corte de 19% apresentando acurácia de 95% na detecção de pacientes com DD grau III.

E aí, o que vocês acham?

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