Pericardite Meningocócica Isolada: Relato de Caso

Trabalho de Conclusão do Curso de Especialização em Ecocardiografia ECOPE/UNICAP do colega Dr. Marcos Frederico de Holanda

Orientador: Dr. José Castillo

Caso Clínico

Paciente masculino, 24 anos, estudante, procurou o serviço de pronto atendimento do seu município com queixa de febre, cefaléia e tosse, com início há sete dias. Foi realizada uma radiografia de tórax, sendo medicado com analgésicos e encaminhado de volta à sua residência. Após três dias de evolução, sem melhora do quadro, apresentou dor torácica, tipo pleurítica, e dispneia progressiva, procurando novamente a unidade de pronto atendimento, sendo encaminhado ao hospital de referência, onde foi internado.

Exame Clínico Admissional

O exame clínico admissional indicou estado geral regular, ansioso, lúcido, orientado no tempo e espaço, taquipneico, hipocorado, hipoperfundido, apresentando ritmo cardíaco regular, taquicárdico, bulhas hipofonéticas, com pulso paradoxal e turgência jugular a 45 graus, pulmões ventilados, sem ruídos adventícios, fígado palpável a 5 cm do rebordo costal, membros inferiores sem edemas;

Exames Laboratoriais

leucocitose com desvio para esquerda (18.500/mm3; Segmentados:81%, Linfócitos:11%), uréia: 54 mg/dl, TGO: 585 U/l, TGP:358 U/l, HIV negativo, Hemoculturas negativas, cultura do líquido cefalorraquidiano (LCR) negativa.

Eletrocardiograma de 12 derivações e radiografia de tórax:

ECG: supradesnivelamento do segmento ST difuso, taquicardia sinusal e sobrecarga de VE.
A – Rx de tórax no serviço de origem: área cardíaca normal, discreta congestão hilar, trama vascular pulmonar com aspecto normal; B – Rx de tórax da admissão hospitalar: aumento significativo da área cardíaca e infiltrado pulmonar difuso.

Ecocardiograma

O Ecocardiograma mostrou função e tamanho ventricular normais. Presença de derrame pericárdico, de grau importante, envolvendo todo o coração, com presença de grande quantidade de material ecodenso, heterogêneo, em espaço pericárdico. Observou-se, também, colabamento do ventrículo direito, com sinais de restrição ao enchimento diastólico, achados esses compatíveis com tamponamento cardíaco:

  • O paciente foi submetido a drenagem pericárdica, com saída de 650 ml de líquido purulento. Foi iniciado terapia antibiótica empírica com ceftriaxona e oxacilina. A cultura do exsudato pericárdico foi positiva para a presença de Neisseria meningitidis, sendo suspenso a administração de oxacilina. Foi colhido LCR que apresentava características normais e cultura bacteriana negativa.
  • Apesar do paciente evoluir com melhora da dispnéia e dor torácica, ainda apresentava picos febris, desta forma novo ecocardiograma revelou persistência de moderada quantidade de material ecodenso no espaço pericárdico da região posterior do coração, a despeito do dreno pericárdico não apresentar débito
  • Foi optado por uma pericardiectomia parcial, com retirada de moderada quantidade de líquido purulento. O paciente evoluiu com melhora dos picos febris, recebendo alta três semanas após seu internamento. Os exames ecocardiográficos de controle após a alta demonstraram resolução do derrame pericárdico e espessamento discreto do pericárdio, sem sinais de constricção.

Conclusão

Pericardite Meningocócica Isolada complicada com tamponamento cardíaco

A nasofaringe humana é depósito natural da Neisseria meningitidis, e em algumas situações esta bactéria pode alcançar a corrente sanguínea, provocando meningococcemia e meningites purulentas.

A incidência de pericardite aguda complicando quadros de infecção meningocócica gira em torno de 19%, o que piora o prognóstico. Pode ser classificada, de acordo com a fisiopatologia, em três tipos:

1) Doença meningocócica disseminada com pericardite (existe meningococcemia e invasão direta do pericárdio pelo patógeno);

2) Pericardite meningocócica isolada (não existe evidência de bacteremia pela Neisseria meningitidis ou meningite purulenta);

3) Pericardite meningocócica reativa (existe uma reação imunológica, cerca de seis a dezesseis dias após o início do tratamento, sendo uma complicação tardia e o agente infeccioso não é encontrado no pericárdio).

A dor torácica é um dos sintomas mais frequentes , sendo necessário a realização de diagnóstico diferencial com outras doenças. O perfil epidemiológico do paciente, geralmente do sexo masculino, jovem, sem fatores de risco para doença coronária, as características da dor, geralmente do tipo ventilatóriadependente e alterações típicas de pericardite aguda no ECG, com supra desnivelamento difuso do segmento ST, direcionam o diagnóstico.

A rápida evolução para tamponamento cardíaco é fato comum neste tipo de infecção.

O tratamento clínico está baseado no uso de aspirina e antiinflamatórios não hormonais, além de antibióticos. Nos casos recorrentes e naqueles com tamponamento cardíaco é indicado o tratamento cirúrgico com pericardiocentese, drenagem pericárdica ou pericardiectomia.



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Georges Ishak

Parabéns Caio
Excelente trabalho.

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