O ecocardiograma é um método importante em vários momentos do transplante (Tx), sendo utilizado desde a avaliação para indicação do Tx cardíaco, na avaliação do potencial doador, acompanhamento intraoperatório, se seguimento da avaliação de rejeição e doença vascular do enxerto, podendo servir também como guia nas biópsias e na avaliação de suas complicações.
Aqui iremos focar no seguimento pós Tx cardíaco e nos achados ecocardiográficos que podem auxiliam no diagnóstico das complicações pós procedimento.
Embora possa haver limitação para obtenção de imagens transtorácicas ideais no período pós-operatório, o acompanhamento com estudos ecocardiográficos seriados é possível na maioria dos casos e possui um papel fundamental. Na fase tardia, esse acompanhamento seriado tem grande valor na detecção de rejeição aguda, doença vascular do enxerto e monitorização das pressões pulmonares.
Em decorrência da variabilidade dos parâmetros derivados da ecocardiografia, é importante ter em mãos um estudo basal abrangente do paciente para comparações futuras, sendo este estudo índice realizado idealmente após pelo menos 6 meses do Tx cardíaco.
Durante o primeiro ano pós Tx, deve-se fazer um ecocardiograma de acompanhamento a cada 3 meses e também sempre que o paciente se submeter a biópsia (Bx) com objetivo de avaliar uma possível complicação e, logicamente, toda vez que houver alguma descompensação clínica.
Os achados ecocardiográficos devem ser interpretados de acordo com os aspectos anatômicos decorrentes da técnica cirúrgica utilizada e das modificações da fisiologia cardíaca resultante da denervação do enxerto cardíaco (consequente à secção do plexo cardíaco).
Atualmente, a técnica bicaval é a técnica cirúrgica mais utilizada para o Tx cardíaco ortotópico, seguida da técnica biatrial (convencional):
1- Técnica biatrial (convencional): as anastomoses do coração doador são realizadas no nível médio de ambos os átrios do receptor, e da aorta ascendente e artéria pulmonar logo acima das valvas semilunares;
2- Técnica bicaval: realizam-se as anastomoses das veias cava superior e inferior em vez de anastomose do átrio direito (AD). A incisão do átrio esquerdo (AE) é realizada de modo a deixar apenas uma pequena porção da parede atrial ao redor das 4 veias pulmonares.
ACHADOS CARACTERÍSTICOS NO TX CARDÍACO:
- Marca hiperecogênica no plano de sutura atrial entre o átrio do doador e do receptor. Essa marca da anastomose é observada em ambos os átrios quando utilizada a técnica biatrial, e apenas no AE na técnica bicaval;
- As suturas das veias cavas, artéria pulmonar e aorta ascendente não são bem visualizadas pelo ecocardiograma transtorácico em adultos, sendo mais facilmente identificadas em crianças;
- Aumento do AE na técnica bicaval e de ambos os átrios na técnica biatrial, principalmente nos seus eixos longitudinais; vale ressaltar que o volume do AE se correlaciona inversamente com a sobrevida dos receptores de Tx cardíaco;
- Disfunção e dilatação do ventrículo direito (VD) são comumente observadas nos primeiros dias pós Tx e são geralmente transitórias, resultantes da exposição do coração transplantado a uma alta resistência vascular pulmonar previamente existente em alguns receptores;
- O movimento assincrônico do septo interventricular e derrame pericárdico discreto são achados comuns no status pós-cirúrgico;
- Outro achado comum é o aumento da espessura do septo e da parede posterior, resultado da inflamação e edema pós-cirúrgico que tendem a diminuir.
FALÊNCIA PRECOCE DO ENXERTO: é definida como disfunção biventricular, com baixo débito cardíaco e altas pressões de enchimento, sendo a principal causa de óbitos nos primeiros 30 dias pós Tx. É atribuída à hipertensão pulmonar e consequente falência ventricular direita, lesão de reperfusão (tempo de isquemia prolongado) ou rejeição hiperaguda (por anticorpos pré-formados do receptor reativos ao enxerto cardíaco).
REJEIÇÃO AGUDA DO ENXERTO: é frequente nos primeiros meses pós Tx, apesar de também ocorrer tardiamente. Sua incidência é estimada em 20-40%, sendo a maior causa de óbito no primeiro ano pós Tx. É causada por uma reação imunomediada do receptor a antígenos do complexo maior de histocompatibilidade do doador, podendo ser mediada por reação do tipo celular (rejeição celular aguda) ou por anticorpos (rejeição humoral aguda).
Apesar de ser uma ferramenta útil na avaliação das alterações estruturais para o diagnóstico da rejeição celular aguda, os achados ecocardiográficos podem ser sutis e não específicos.
1- O primeiro sinal ecocardiográfico descrito relacionado com a presença de rejeição celular aguda foi o aumento da espessura de parede resultante do edema intersticial.
2 – Como já foi dito, a presença de derrame pericárdico pode ser comum no pós operatório (2/3 dos pacientes) e pode persistir até o terceiro mês após o procedimento, contudo uma piora do derrame, assim como aparecimento de um derrame novo foram relacionados com a ocorrência de rejeição aguda.
3 – As alterações histológicas decorrentes da rejeição celular aguda modificam principalmente as propriedades de relaxamento e complacência do miocárdio, levando a alterações precoces do enchimento ventricular e disfunção predominantemente diastólica. Muitos estudos utilizaram índices de função diastólica derivados da avaliação com o Doppler pulsátil do fluxo transmitral (pico de velocidade E, pico de velocidade A, relação E/A, TRIV, TDA da onda E) para o diagnóstico precoce de rejeição celular aguda, porém esses parâmetros possuem limitações (dependem da FC – normalmente elevada em pacientes transplantados – e das condições de carga). Por outro lado, ficou demonstrando que parâmetros derivados do Doppler tecidual possuem desempenho melhor.
FALÊNCIA TARDIA POR DOENÇA VASCULAR DO ENXERTO: caracteriza-se por um processo fibro-proliferativo (hiperplasia difusa da camada íntima e proliferação das células musculares lisas) resultante de lesão endotelial cumulativa, levando a um estreitamento concêntrico e obliteração dos vasos coronários. Sua prevalência é de 20% em 03 anos, 30% em 05 anos e aproximadamente 50% após 10 anos do Tx cardíaco.
A ecocardiografia de repouso possui sensibilidade baixa para este diagnóstico. Alguns estudos, porém, demonstraram alta especificidade quando na presença de anormalidades da contratilidade segmentar em repouso. O ecocardiograma com estresse tem sido utilizado como método diagnóstico de vigilância da doença vascular do enxerto.
ECOCARDIOGRAFIA COM SPECKLE-TRACKING: em pacientes transplantados, demonstrou-se que o Strain Longitudinal global em pacientes com doença vascular do enxerto foi menor do que em indivíduo saudáveis, além de se correlacionar com a severidade da doença. Além disso, o Strain Rate associado à ecocardiografia com estresse pela dobutamina demonstrou acurácia satisfatória para o diagnóstico de doença vascular do enxerto.
Em decorrência da possibilidade do cálculo do strain para os diferentes segmentos, esta técnica pode ser útil na detecção de rejeição celular aguda, já que esta condição pode ocorrer em focos isolados do miocárdio.
Graduado em medicina pela Universidade Potiguar (UnP). Possui residência em Clínica Médica, pelo Hospital Universitário Onofre Lopes – HUOL (UFRN), e em Cardiologia, pelo Procape – UPE. Porta o título de especialista em Cardiologia, pela Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC). E é pós-graduado em Ecocardiografia, pela ECOPE.
Excelente leitura,de um conteúdo riquíssimo em informações básica e dinâmica de uma qualificação profissional!Pr Dr William Andrade
Muito obrigada, William!
[…] publicação anterior foi falado sobre os achados ecocardiográficos após transplante cardíaco, bem como da […]
Oii estava navegando em seu blog e encontrei diversos artigos interessante como este, alias estou adorando conhecer este blog.
topflix.app.br
Exames precisos são crucial para um diagnostico. Muito bom seu artigo.
clique aqui para acessar o site