CARDIO-ONCOLOGIA:
Em termos de insuficiência cardíaca (IC), a maioria das pesquisas em cardio-oncologia foram realizadas nos pacientes em tratamento com antracíclicos, muito embora outras classes de quimioterápicos também possam ser cardiotóxicas.
A identificação precoce daqueles pacientes sob maior risco de desenvolver disfunção cardíaca é crucial, uma vez que os sintomas costumam aparecer apenas em estágios mais tardios e, por consequência, em fases de pior prognóstico.
A avaliação pré-quimioterapia deve ser estimulada já que uma fração de ejeção (FE) do ventrículo esquerdo (VE) alterada no exame de base possui valor prognóstico para predizer quais pacientes em quimioterapia vão desenvolver eventos cardíacos.
O strain global longitudinal (SGL) do VE apresenta valor prognóstico e uma das maiores aplicações no contexto da cardio-oncologia se dá naqueles pacientes com FEVE limítrofe. Em estudo com 158 pacientes com FEVE variando entre 50-60% e que seriam posteriormente submetidos à quimioterapia com antracíclicos, Mousavi et al., conseguiu demonstrar que o strain ofereceu valor incremental à FEVE, com um strain basal < 16% se associando com uma maior ocorrência de IC sintomática e morte cardíaca.
Vários outros estudos mostraram que o SGL do VE se altera da forma precoce durante o tratamento com antraciclinas, traztuzumab ou radioterapia, precedendo a redução da FEVE propriamente dita, que costuma ocorrer em estágios mais avançados.
Uma meta-análise conduzida por Oikonomou et al. mostrou que pacientes com um SGL alterado durante o tratamento quimioterápico apresentaram um Odds ratio de 12.2 para o desenvolvimento de disfunção cardíaca relacionada à quimioterapia. Da mesma forma, pacientes com redução relativa do SGL após o início da quimioterapia tiveram 15.8 vezes mais chances de desenvolver disfunção cardíaca quando comparados com pacientes que não apresentaram alteração do SGL durante o tratamento.
No caso do uso de antraciclinas, uma redução de 10% do valor do SGL para considerar toxicidade cardíaca por quimioterápicos apresenta sensibilidade de 78% e especificidade de 79%. Por outro lado, uma diminuição de 15% (exemplo: queda absoluta de 3% num SGL basal de 20%) durante a quimioterapia já é considerada como disfunção sistólica subclínica.
É aconselhável, portanto, que se inicie terapia medicamentosa cardioprotetora já naqueles pacientes que apresentam uma queda de 12% no SGL durante o tratamento, independentemente se houver ou não alteração da FEVE.
DOENÇA CARDÍACA ISQUÊMICA:
A análise do strain global longitudinal e do strain segmentar fornece uma informação mais objetiva sobre a contratilidade miocárdica, aumentando a acurácia diagnóstica da doença arterial coronária obstrutiva grave nos pacientes com suspeita de síndrome coronariana aguda (SCA) sem supradesnivelamento do segmento ST. Mesmo naqueles sem déficit contrátil segmentar na avaliação bidimensional houve uma diminuição significativa do SGL e strain segmentar quando na presença de estenose coronária importante.

O SGL do VE também apresenta potencial na detecção da disfunção ventricular esquerda latente por isquemia miocárdica secundária à obstrução coronária. Uma revisão sistemática e meta-análise sobre a acurácia diagnóstica do SGL do VE para predizer estenose coronária significativa em pacientes com que se apresentavam com dor torácica (aguda ou crônica) revelou que a medida do SGL do VE em repouso apenas apresentou uma acurácia modesta. O valor de corte para predizer obstrução coronária significativa variou entre 17.4-19.7%, com sensibilidade de 51-81% e especificidade de 58-81.
Quanto à viabilidade miocárdica após um infarto agudo do miocárdio, a análise do strain também apresentou uma acurácia diagnóstica moderada. Por outro lado, valores entre 10-15% podem predizer a possibilidade de remodelamento cardíaco mesmo após uma revascularização bem sucedida (AUC 0.73-9.88).
Naqueles pacientes com infarto agudo do miocárdio (IAM) tratados com abordagem percutânea primária, o SGL do VE pode ser utilizado como parâmetro prognóstico. Diferentes estudos demonstraram que uma diminuição do SGL se associou de forma significativa com eventos adversos. Para cada redução de 1% do strain, o risco relativo de algum evento adverso aumentou 34%.
O strain do ventrículo direito (VD) também possui valor prognóstico neste cenário. Em um estudo com 621 pacientes com IAM e submetidos à angioplastia percutânea primária, a análise univariada mostrou que o strain de parede livre do VD se associou de forma significativa com a mortalidade por todas as causas.
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Graduado em medicina pela Universidade Potiguar (UnP). Possui residência em Clínica Médica pelo Hospital Universitário Onofre Lopes – HUOL (UFRN) e em Cardiologia pelo Procape – UPE. Porta o título de especialista em Cardiologia pela Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC) e é pós-graduado em Ecocardiografia, pela ECOPE.