Como já sabemos, a valva mitral é composta por dois folhetos (anterior e posterior) e que, na maioria dos casos, se ligam, através das cordoalhas tendíneas, a dois músculos papilares (anterolateral e posteromedial). Contudo, isso nem sempre acontece.
Alterações congênitas da valva mitral correspondem a aproximadamente 0,4% de todos as cardiopatias congênitas. Uma delas, normalmente diagnosticada durante a infância, é a valva mitral em paraquedas (incidência 0.17%). Nestes casos, as cordoalhas tendíneas estão ligadas a apenas um músculo papilar, e encontram-se encurtadas, espessadas e, por vezes, aderidas (repuxando os folhetos e dando uma aparência de paraquedas).
Na valva mitral em paraquedas verdadeira, as cordoalhas se conectam a apenas um músculo papilar, normalmente em posição mais central, contudo, em alguns casos, podem existir dois músculos papilares (sendo muitas vezes um hipoplásico), com inserção desigual das cordoalhas. Nessas situações, temos o que se chama de “valva mitral em paraquedas like”.
Por haver encurtamento e espessamento das cordoalhas, com frequência há restrição da mobilidade dos folhetos valvares, sendo a estenose a lesão mais frequentemente associada. Alguns pacientes podem se apresentar com regurgitação mitral (nestes casos, classificadas com tipo IIIB de Carpentier) ou até mesmo ter a valva normofuncionante, sendo o diagnóstico realizado de forma ocasional em exame de rotina.
A valva mitral em paraquedas pode fazer parte de um conjunto de outras alterações estruturais cardíacas em um mesmo paciente em cerca de 95% dos casos. Esta alteração faz parte do chamado Complexo de Shone (0.6% das cardiopatias congênitas), caracterizado por valva mitral em paraquedas, anel supravalvar mitral, estenose subaórtica e coarctação de aorta. Porém outras lesões associadas (que não o chamado Complexo de Shone) podem estar presentes:
- Estenose aórtica (32%);
- Defeitos do septo interatrial (54%);
- Hipoplasia do ventrículo esquerdo (19%).
Dispneia e fibrilação atrial são as manifestações mais comuns dos pacientes com valva mitral em paraquedas, porém o quadro clínico vai depender da natureza da alteração valvar preponderante, bem como a evolução clínica. Nos casos assintomáticos e sem repercussões hemodinâmicas, nenhuma abordagem específica se faz necessária. Já no casos em que há alteração da dinâmica valvar (estenose/regurgitação), muitas vezes é preciso realizar a troca valvar.
Graduado em medicina pela Universidade Potiguar (UnP). Possui residência em Clínica Médica, pelo Hospital Universitário Onofre Lopes – HUOL (UFRN), e em Cardiologia, pelo Procape – UPE. Porta o título de especialista em Cardiologia, pela Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC). E é pós-graduado em Ecocardiografia, pela ECOPE.