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Septo Sigmoide: um achado relacionado à idade ou variante de cardiomiopatia hipertrófica ?

O septo sigmoide se caracteriza por uma protusão miocárdica focal da região basal do septo interventricular resultante de uma angulação acentuada da raiz de aorta que ocorre com o processo de envelhecimento. Logo, é uma condição comumente observada em pacientes idosos.

DUST – discrete upper septal thickening – Echocardiography. 2017;1–11.

Apesar de ser habitualmente assintomático e, portanto, ter um comportamento benigno, o septo sigmoide pode, em alguns poucos casos, levar a obstrução da via de saída do ventrículo esquerdo (VSVE), sendo considerado neste contexto como um possível fenótipo da cardiomiopatia hipertrófica (CMPH).

Echocardiography. 2017;1–11

Quando isso ocorre, sintomas com dispneia, dor torácica ou síncope induzidos pelo esforço físico podem estar presentes.

Definido por alguns autores como hipertrofia focal (acometendo o primeiro 1/3 do septo interventricular), com aspecto descrito como “dune-like” (em “duna”, por tradução literal – ou seja, um cone muscular), protruindo-se para a VSVE e com espessura diastólica ≥ 12 mm em mulheres e ≥ 13 em homens (devendo ter espessura > 50% maior que a espessura diastólica da região média do septo interventricular).

A prevalência é estimada em 1.5-7% da população e geralmente os pacientes apresentam bom prognóstico.

De forma geral, o septo sigmoide não interfere no fluxo da VSVE, porém em condições hemodinâmicas adversas (anemia, aumento da pré-carga, durante esforço físico …) pode haver aumento da velocidade do fluxo nesta região.

O grande desafio, quando na presença de sintomas, é diferenciar o septo sigmoide entre uma condição adquirida de fenótipo de CMPH septal assimétrica obstrutiva.

Alguns estudos já avaliaram as variantes relacionadas à presença do septo sigmoide e observaram que os pacientes com a variante adquirida costumam ser mais velhos, não apresentam fibrose miocárdica na ressonância magnética e (obviamente!!!) possuem teste genético sem mutações sarcoméricas.

Em estudo (doi:10.1016/j.hlc.2010.06.793) com 2671 pacientes, septo sigmoide foi considerado quando na presença de hipertrofia focal (> 15 mm) da região basal do septo interventricular não associada a hipertrofia em qualquer outra região ventricular esquerda.

Nesta análise foram comparadas as características clínicas e ecocardiográficas dos pacientes com e sem obstrução d VSVE.

132 pacientes (4.94%) apresentavam septo sigmoide, sendo a idade média de 76.5 anos (49.2% sexo masculino). A espessura diastólica média na região da hipertrofia focal foi de 17.9 ± 0.26 mm, com uma relação septo sigmoide/parede posterior de 1.77 ± 0.37.

Gradiente na via de saída, em repouso ou provocado, > 20 mmHg foi identificado em 10/132 pacientes (7.58%). Estes eram mais jovens (68.4 x 77.4 anos, P = 0.01), com função ventricular esquerda descrita como “hipercontrátil” (fração de encurtamento 51.2% x 41.6%, P = 0.02), contudo apresentavam espessura diastólica similar àqueles sem obstrução de VSVE (17.4 mm x 18.0 mm, P = 0.54).

Deslocamento do ponto de coaptação da valva mitral (P = 0.007), com movimento sistólico anterior (P = 0.002) foram também observados naqueles pacientes com obstrução do fluxo na VSVE, sendo, segundo os autores, características cruciais para a diferenciação do septo sigmoide e da variante da CMPH.

Gerado a partir de IA e adaptado de Heart, Lung and Circulation
2010;19S:S1–S268

Fazendo uma rápida revisão na internet, encontrei alguns relatos de casos relacionados ao septo sigmoide sintomático.

Mulher, 73 anos de idade, admitida no pronto socorro após síncope durante esforço físico. Ao exame, notava-se sopro sistólico em foco aórtico (3+) e ecocardiograma documentava a presença de hipertrofia de 18 mm confinada à região basal do septo interventricular.

A espessura diastólica dos demais segmentos do septo interventricular e da parede posterior era de 8 mm e a velocidade de pico na via de saída do ventrículo esquerdo era de 4.3 m/s, com gradiente máximo de 74.2 mmHg. Havia também refluxo valvar mitral moderado secundário à presença de movimento sistólico anterior (SAM) da valva mitral.

Foi iniciada terapia com bisoprolol 1.25 mg/dia com melhora sintomática e desaparecimento do SAM (figura D). A velocidade máxima da via de saída do ventrículo esquerdo, observada em avaliação posterior, foi de 1.5 m/s, com gradiente de pico de 7.4 mmHg. Um ecocardiograma com estresse físico foi realizado, com boa resposta durante o esforço e ausência de sintomas.

Ainda, a paciente foi submetida a estudo com ressonância magnética cardíaca para descartar a presença do septo sigmoide como parte de um fenótipo de CMPH. O resultado, contudo, não demonstrou fibrose miocárdica.

Mulher, 71 anos de idade, sem histórico de eventos cardiovasculares prévios, admitida por queixa de dispneia aos esforços. Apresentava-se com pressão arterial de 200×100 mmHg e radiografia de tórax demonstrada congestão pulmonar moderada a severa.

Exames laboratoriais evidenciavam anemia macrocítica com hemoglobina de 7.4 g/dL e hematócrito de 26%, cuja etiologia foi posteriormente atribuída ao diagnóstico de úlcera péptica.

Cateterismo cardíaco não documentou doença coronária obstrutiva, porém mostrava gradiente de 80 mmHg na via de saída do ventrículo esquerdo.

A paciente apresentou melhora sintomática após Diltiazem 100 mg/dia e Carvedilol 5 mg/dia.

Posteriormente, a paciente apresentou piora dos sintomas e novos exames mostraram hemoglobina de 4.5 g/dL e hematócrito de 14.6%.

Ecocardiograma mostrou hipertrofia focal da região basal do septo interventricular, presença de SAM, com velocidade de pico na via de saída de 6.25 m/s e gradiente máximo de 156 mmHg.

Journal of Cardiology Cases (2010) 1, e144—e146

Após realização de transfusão sanguínea (hemoglobina 12.4 g/dL), foi observada redução significativa do gradiente pressórico na via de saída do ventrículo esquerdo (14 mmHg) e ausência de SAM, bem como melhora dos sintomas relatados pela paciente.

Journal of Cardiology Cases (2010) 1, e144—e146

Assim, ficou documentada obstrução dinâmica da VSVE induzida pela anemia.

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