O usuário de esteroides anabolizantes dentro do laboratório de ecocardiografia .
Atualmente, estima-se que 6,4% dos homens e 1,6% das mulheres utilizem esteroides anabolizantes ( EA) globalmente, sendo os esportistas recreativos os maiores usuários . Atualmente a maior motivação para o uso dos EA é melhorar a imagem corporal, enquanto o fisiculturismo competitivo e o desempenho atlético (não fisiculturismo) são secundários e terciários, respectivamente [ 1 ].
Os cursos de medicina do exercício e do esporte atualmente , possuem em sua grande maioria a abordagem de temas relacionados a utilização dos EA , além disso , temos um grande número de profissionais médicos que atuam em áreas , como “antienvelhecimento” (“anti-aging”), “medicina integrativa”, “performance” e “modulação hormonal”, utilizando em seus arsenais terapêuticos os EA , sendo este um tema que gera polêmica e grandes discussões entre as sociedades médicas .
Independente da posição assumida pelas sociedades médicas , um ponto deve ser lembrado , a utilização do uso de EA tanto para o ganho de força e performance por atletas de diversas modalidades , assim como a utilização destas substâncias para fins estéticos está amplamente difundida e cada vez mais estes pacientes estão presentes em nossos laboratórios de imagem , tendo em vista que a avaliação cardiovascular deve fazer parte da conduta do médico do esporte .
Acreditamos ser oportuno expandir o nosso horizonte de observação para estes pacientes , entendendo que o ecocardiografista pode se deparar com sobreposições diagnósticas onde mudanças de massa e/ou volume do ventrículo esquerdo ( VE ) podem representar apenas um fenótipo compatível a uma adaptação fisiológica ao treinamento “ coração do atleta “ ou a processos patológicos . É imperativo que nós façamos uma abordagem individualizada para a interpretação da avaliação destes pacientes , pois a expressão do coração do atleta é influenciada por vários fatores e o uso de esteróides anabolizantes está incluído nesta abordagem .
O uso de EA está associado a níveis elevados de pressão arterial sistólica e diastólica e ao desenvolvimento de hipertrofia concêntrica do VE , que podem persistir mesmo após a interrupção do uso [ 2 , 3 ] . Associado a este remodelamento temos a diminuição da complacência ventricular esquerda , fator não compatível a uma adaptação fisiológica relacionada ao treinamento de força .
Entendendo a dificuldade gerada nestas avaliações e sabendo que o uso de técnicas ecocardiográficas avançadas como o strain e o trabalho miocárdico ( MW) permitem uma avaliação quantitativa e objetiva da função ventricular regional e global , principalmente quando o valor da fração de ejeção está dentro da normalidade , provavelmente você poderá se deparar com uma dúvida que se torna cada vez mais frequente nesse grupo de pacientes , será que estamos avaliando uma adaptação fisiológica ao treinamento de força ou um remodelamento patológico provocado pelo uso de EA ?
A análise do strain e do MW abrem espaço para novos insights sobre a caracterização da mecânica cardíaca no coração dos atletas sendo muito importantes para a detecção da presença de disfunção sistólica subclínica do VE auxiliando no diagnóstico em estágios inciais de alterações cardíacas mesmo quando a FEVE ainda é normal ( 4 ) .
Não podemos fechar os olhos para a prescrição de EA nos consultórios médicos e sua relação com mudanças na mecânica cardíaca, pois este conhecimento pode ser a diferença entre um diagnóstico de “coração de atleta “ ou a “presença de disfunção sistólica subclínica do VE” , nestes pacientes.
Bibliografia
1- The global epidemiology of anabolic-androgenic steroid use: a meta-analysis and meta-regression analysis doi.org/10.1016/j.annepidem.2014.01.009
2- Left ventricular hypertrophy or storage disease? the incremental value of speckle tracking strain bull’s-eye DOI: 10.1111/echo.13506
3- Increased blood pressure and aortic stiffness among abusers of anabolic androgenic steroids: potential effect of suppressed natriuretic peptides in plasma?doi.org/10.1097/HJH.0000000000001546
4-The Role of Multimodality Imaging in Athlete’s Heart Diagnosis: Current Status and Future Directions doi.org/10.3390/jcm10215126
Formado em medicina desde 2004, especialista em medicina esportiva desde 2006 , pós-graduação em cardiologia e ecocardiografia pelo IPGMRJ.
Mestrando em cardiologia pela UFF.
Coordenador do Laboratório de ecocardiografia esportiva – Ipanema Health Club
Professor da pós-graduação em medicina esportiva da UNIG e professor assistente do curso de cardiologia esportiva anual, da Dra Renata Castro