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ESTRUTURAS ANATÔMICAS DO ÁTRIO DIREITO QUE FREQUENTEMENTE GERAM DÚVIDAS AO ECOCARDIOGRAMA.

Embora este tema já tinha sido abordado no blog da Ecope de 2021 (https://blog.escolaecope.com.br/anatomia-ecocardiografica-do-atrio-direito/), vale a pena a sua repetição, visto o frequente aparecimento de dúvidas.

A anatomia dos átrios apresenta disposição característica devido à desembocadura das veias sistêmicas e pulmonares (Figura 1).

Figura 1. O AD recebe as veias sistêmicas de forma vertical, entrando superiormente a VCS e inferiormente a VCI, Já o AE recebe as veias pulmonares transversalmente, mostrando uma disposição  cruzada com relação às veias sistêmicas. 

Esta disposição resulta em aspecto diferente dos átrios quando analisados pela ecocardiografia bidimensional no corte apical (Figura 2).

Figura 2. Corte apical de 4 câmaras mostrando o aspecto dos átrios. O AE recebe, no seu teto, a inserção das veias pulmonares direitas e esquerdas. O AD não apresenta a entrada das veias cavas, visto que estas entram em plano perpendicular às veias esquerdas. Sua entrada está representada por um círculo tracejado.

Algumas estruturas anatômicas do AD podem ser visualizadas com a ecocardiografia e, eventualmente, confundidas com estruturas patológicas. A anatomia do AD compreende, ademais da desembocadura superior e inferior das veias cavas, a região trabeculada (região pectínea), separada da região lisa (que forma o septo interatrial) pela crista terminalis, a válvula de Eustáquio, originada na desembocadura da VCI e que se dirige para o limbo inferior da fossa oval, a válvula de Tebesius, originada junto à desembocadura do seio coronário, dirigindo-se ao anel tricúspide, o próprio seio coronário e o apendice atrial direito, geralmente visualizado apenas pelo eco transesofágico (Figura 3).

Figura 3. Vista anterior do AD, com a porção trabeculada, formada pela musculatura pectínea, que continua na porção antero-superior da cavidade com o apêndice atrial direito. A crista terminalis se dirige desde a VCS até a porção inferior do AD separando as porções trabeculada e lisa. A porção lisa, formada pelo septo interatrial, onde se distingue o forame oval. Na região inferior, junto à VCI, a válvula de Eustáquio, dirigindo-se ao limbo inferior do forame oval (esta estrutura está destinada a desviar o sangue oxigenado proveniente da veia umbilical, que desemboca na VCI, para o forame oval, de forma à oxigenar as câmaras esquerdas fetais). Próxima à inserção da valva tricúspide encontra-se a desembocabura do seio coronário, que produz uma dobra denominada válvula de Tebesius.

Com a ecocardiografia transtorácica frequentemente podemos observar a válvula de Eustáquio (Figuras 4 A e B).

Figura 4A. À esquerda, válvula de Eustáquio vista pelo corte apical de 4 câmaras.

Figura 4B. Válvula de Eustáquio vista pelo corte transversal dos vasos da base.

A válvula de Eustáquio também pode ser visualizada pelo eco transesofágico (Figura 5).

Figura 5. Válvula de Eustáquio vista pelo corte bicaval do eco transesofágico.

A válvula de Eustáquio pode ser confundida com uma estrutura patológica, principalmente quando aparece de forma sutil (Figura 6) ou redundante (Figura 7)

Figura 6. Acima, válvula de Eustáquio no interior do AD aparecendo de forma sutil. Embaixo, válvula de Eustáquio redundante.

rede de Chiari é um remanescente congênito da válvula direita do seio venoso, presente em até 4% da população. Pode ser redundante a induzir o falso diagnóstico de tumoração ou infecção (Figura 7).

Figura 7. Rede de Chiari proeminente, vista em peça anatômica, localizada próxima à desembocadura do seio coronário, projetando-se para a região trabeculada do AD, próximo ao anel tricuspídeo.

Ao ecocardiograma pode aparecer em vários cortes, como 4 câmaras, subcostal e paraesternal modificado (Figuras 8 a 10).

Figura 8. Rede de Chiari vista desde a posição de 4 câmaras.
Figura 9. Rede de Chiari vista desde o corte subcostal.
Figura 10. Rede de Chiari vista desde o corte paraesternal modificado.

A rede de Chiari aparece também no eco transesofágico (Figura 11).

Figura 11. Rede de Chiari vista pelo eco transesofágico.

Outra estrutura anatômica que pode ser confundida com uma imagem patológica é a crista terminalis, que separa a porção trabeculada da porção lisa do AD, desde a desembocadura da VCS até a desembocadura da VCI. Pode aparecer como uma imagem arredondada no teto do AD apresentando vários tamanhos, desde uma imagem quase linear até uma estrutura volumosa (Figuras 12 e 13).

Figura 12. Crista terminalis de pequeno tamanho observada no teto do AD (acima) e mais proeminente (embaixo).
Figura 13. Crista terminalis muito volumosa observada no teto do AD.

Frequentemente, a crista terminalis é observada pelo eco transesofágico, próxima à desembocadura da VCS (Figura 14).

Figura 14. Ecocardiograma transesofágico em corte bicaval (esquerda) e paraesternal alto transversal, mostrando a crista terminalis junto à desembocadura da VCI.

Lembrando que o ecocardiograma não faz diagnóstico etiológico, alguns aspectos são importantes na diferenciação das estruturas anatômicas e patológicas.

Em primeiro lugar, a clínica do paciente e o histórico, por exemplo, do abuso de entorpecentes, procedimentos percutâneos como uso de catéteres, marcapassos ou cirurgias prévias. Em pacientes assintomáticos esses achados geralmente, com raras exceções, correspondem a estruturas anatômicas.

Pacientes com trombose venosa profunda podem apresentar trombos aderidos às estruturas do AD, geralmente muito móveis e volumosos (Figura 15).

Figura 15. Paciente com antecedentes de trombose venosa profunda evidenciando grande trombo no interior do AD. Estes casos podem evoluir para tromboembolismo pulmonar agudo.

Cateteres de longa duração, como os utilizados para diálise, podem apresentar trombos aderidos dentro do AD. A utilização de vários cortes ecocardiográficos e uma adequada anamnese ajudam no diagnóstico (Figura 16).

Figura 16. Acima, corte apical de 4 câmaras evidenciando imagem móvel no teto do AD, em paciente portador de catéter de diálise. A imagem da parte inferior, obtida pelo eixo menor, mostra o eco do catéter, caracterizado pela luz do mesmo.

Outros ecos que podem ocupar o interior do AD são os tumores, sendo os mais frequentes os mixomas, geralmente aderidos ao septo interatrial, podendo ser pedunculados ou sésseis. Mais raros, os hemangiomas, formados por cistos cheios de sangue, são de mais difícil visualização e diferenciação com as estruturas anatômicas. A utilização de contraste ecocardiográfico auxilia na delimitação de estas massas (Figura 17).

Figura 17. Hemangioma cavernoso aderido à face atrial direita do septo atrial. Seu conteúdo, formado por sangue, faz difícil sua diferenciação das estruturas adjacentes, mas a utilização de contraste ecocardiográfico permite evidenciar seu aspecto tumoral.

Existem várias outras estruturas anatômicas e patológicas que podem aparecer no AD, como o anel tricúspide proeminente, os fibroelastomas papilíferos da região da valva tricúspide, tumores como rabdomiomas, lipomas, teratomas e tumores malignos infiltrativos, mas são achados muito pouco frequentes.

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