INSUFICIÊNCIA TRICÚSPIDE:
A insuficiência tricúspide (IT) é um achado ecocardiográfico comum na população geral, com maior prevalência em mulheres e em pacientes idosos. Quando discreta (trivial) ou leve costuma ter, na maioria das vezes, um comportamento benigno.
A IT significante, considerada como aquela ≥ moderada, apresenta uma prevalência, ajustada para idade e sexo, aproximada de 0.55% (4% em indivíduos com ≥ 75 anos de idade). Quando importante, por sua vez, a IT se associa a um maior risco de morte e insuficiência cardíaca (IC), independente da presença de comorbidades, função ventricular e pressões no leito pulmonar.
Apenas 8-10% dos pacientes com IT apresentam alterações anatômicas claras do aparato valvar tricúspide (IT primária), cujas causas podem ser endocardite infecciosa, doença reumática, síndrome carcinoide, alterações congênitas (anomalia de Ebstein, por exemplo), radiação em região torácica, doença mixomatosa ou até mesmo traumas ou danos iatrogênicos (pós biópsia endomiocárdica, por exemplo).

IT secundária a dispositivos cardíacos implantáveis representa uma condição distinta, com diagnóstico e abordagem específicos. Neste contexto, temos a possibilidade de uma IT causada pelo próprio eletrodo do dispositivo (“cardiac implantable electronic device – CIED related“) ou se a causa foi incidental (“CIED- associated“).
Nos casos de IT secundária, os folhetos valvares estão estruturalmente normais e a regurgitação é causada por dilatação do anel tricúspide e/ou tethering por dilatação do átrio direito (AD) e/ou do ventrículo direito (VD). Baseado no mecanismo preponderante, dois fenótipos são propostos:
- IT Atrial: principalmente causada por fibrilação atrial (FA) e caracterizada pela ausência de tethering significativo, mas com dilatação pronunciada do AD e do anel valvar, associada a um VD com diâmetros normais e função sistólica preservada, bem como com pressões pulmonares e função ventricular esquerda normais;
- IT Ventricular: ocorre pela dilatação do anel valvar e tethering dos folhetos da valva tricúspide como consequência de doenças do lado esquerdo do coração (hipertensão pulmonar pós capilar) ou por doença primária do VD.
É verdade, porém, que em estágios avançados, estes dois fenótipos podem ser indistinguíveis, sendo o diagnóstico em fases iniciais da disfunção um ponto chave para a determinação prognóstica.
A ecocardiografia, como em qualquer doença valvar, é o exame recomendado para a avaliação da IT, que deve consistir na graduação da disfunção, caracterização morfológica e na tentativa de determinar a etiologia, incluindo a caracterização das alterações do lado esquerdo do coração e, na presença de dispositivo cardíaco implantável, a localização dos eletrodos e como estas estruturas se relacionam com o aparato valvar. Ainda, o impacto da IT nas câmaras cardíacas e nas pressões venosa central (veia cava inferior) e pulmonar são parte desta avaliação.
Na maioria dos casos, o estudo transtorácico consegue fornecer informações suficientes, porém o ecocardiograma transesofágico pode ser necessário nos casos em que há uma necessidade de uma melhor caracterização do aparato tricuspídeo. Pacientes candidatos a algum tipo de intervenção podem se beneficiar da ecocardiografia tridimensional e da análise com strain.
A avaliação da gravidade da regurgitação tricúspide deve ser realizada, preferencialmente, com o paciente em euvolemia e com pressões sistêmica e pulmonar otimizadas, sempre através de uma abordagem envolvendo diferentes parâmetros avaliativos.

Uma padronização de graduação além do “importante”, que inclui “massivo” e “torrencial” já tem sido proposta no intuito de avaliar a diminuição da regurgitação valvar após intervenção transcateter.
A avaliação ecocardiográfica do VD é desafiadora dada a sua complexa geometria e alta dependência das condições de enchimento. Quando possível, a avaliação acurada do diâmetro do VD, bem como dos parâmetros de função e das estimativas de volume são informações necessárias para a tomada da decisão terapêutica. Neste cenária, o estudo através da ressonância magnética cardíaca pode ser utilizado.

É importante lembrar que, no cenário de IT importante, a função sistólica do VD estará frequentemente superestimada e, por isso, devemos ter cuidado em relação aos pontos de corte para os valores de normalidade dos parâmetros de função sistólica.
Da mesma forma, o ecocardiograma habitualmente subestima as pressões pulmonares no contexto da IT importante. Assim, o cateterismo de câmaras direitas deve ser recomendado para esse propósito.
O acoplamento ventrículo-pulmonar se relaciona com a capacidade/habilidade do VD de manter seu inotropismo em razão da pós carga pulmonar, ofertando um débito cardíaco adequado. Esta medida pode ser avaliada de forma não invasiva pela ecocardiografia através relação TAPSE/PSAP.
Um desacoplamento VD-Pulmonar, ou seja, uma baixa relação TAPSE/PSAP, ocorre quando aumentos sustentados da pós carga não podem ser mais acompanhados pela capacidade contrátil do VD (ausência de reserva) e se associa a um pior prognóstico.

ESTENOSE TRICÚSPIDE:
A estenose valvar tricúspide é uma condição relativamente rara e que se associa, mais comumente, a alterações congênitas ou distúrbios enzimáticos, como doença de Fabry e doença de Whipple.
Quando de forma adquirida, pode ter etiologia reumática ou secundária a doença carcinoide. Causas ainda mais raras incluem medicações ou obstrução da via de entrada do ventrículo direito (VD) por trombose ou endocardite de dispositivo cardíaco implantável.
Espessamento dos folhetos valvares com ou sem calcificação, e com fusão comissural são achados indicativos de acometimento reumático. Um gradiente médio > 5 mmHg em repouso (frequência cardíaca normal) se relaciona com estenose tricúspide importante.

Apesar do reparo valvar ser preferível em pacientes jovens, a troca valvar frequentemente é requerida. Próteses biológicas são preferíveis às mecânicas dado o risco de trombose pelo regime de baixa pressão no sistema protético. Nos casos de degeneração de bioprótese, a abordagem percutânea tipo “valve-in-valve” pode ser uma boa alternativa.
Naqueles pacientes com síndrome carcinoide, uma condição oncológica estável é requisito para qualquer tipo de intervenção invasiva.


Graduado em medicina pela Universidade Potiguar (UnP). Possui residência em Clínica Médica pelo Hospital Universitário Onofre Lopes – HUOL (UFRN) e em Cardiologia pelo Procape – UPE. Porta o título de especialista em Cardiologia pela Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC) e é pós-graduado em Ecocardiografia, pela ECOPE.