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Ecocardiografia Esportiva – Utilização dos Métodos de Imagem Cardiovascular no Diagnóstico das Consequências do Abuso de Esteroides Anabolizantes: revisão de artigo

A utilização de esteroides anabolizantes androgênico (EAA), seja para fins de performance ou estéticos, é uma realidade na nossa população. Com isso, cresce exponencialmente os relatos das complicações relacionadas ao abuso dessas substância, sobretudo as cardiovasculares.

Trago aqui um artigo de revisão sobre os métodos de imagem cardiovascular no diagnóstico das consequência do abuso de EAA publicado na Revista Cearense de Cardiologia com coautoria do nobre colega Dr. José Diógenes Marques Ribeiro Filho (perfil do instagram @zediogenes), médico cardiologista do Hospital de Messejana.

A utilização dos métodos de imagem cardiovascular no diagnóstico das consequências do abuso de esteróides anabolizantes, SBC / CE | Ano XXI | Dezembro 2024

Com o crescimento dos praticantes de atividade física, de certa forma, se popularizou o estilo de vida “fitness”, no qual o objetivo nem sempre é só saúde, mas também a busca pelo físico ideal e melhora da imagem corporal. Como consequência, ocorreu um aumento do uso de estratégias para melhorar a performance nos treinos, seja com manipulações de “suplementos”, seja com atalhos anabólicos muitas vezes danosos à saúde.

A principal indicação clínica da utilização de androgênicos atualmente é para o tratamento do hipogonadismo masculino e terapia hormonal transgênero guiado por especialistas em doses adequadas. No entanto, a utilização dos EAA para fins estéticos e/ou para melhora de performance quase sempre é feita em doses suprafisiológicas, aumentando a incidência de complicações.

O diagnóstico da cardiomiopatia associada a EAA envolve uma abordagem que inclui um histórico completo do uso de EAA (ou outras subsâncias associadas), análise laboratorial e modalidades de imagem para avaliar a disfunção cardíaca.

A utilização dos métodos de imagem cardiovascular no diagnóstico das consequências do abuso de esteróides anabolizantes, SBC / CE | Ano XXI | Dezembro 2024

Nesse contexto, a ecocardiografia costuma ser o método mais comumente usado para determinar a disfunção cardíaca. Vale ressaltar, porém, que a não utilização de recursos avançados, como o strain e trabalho miocárdico, poderá “mascarar” o dano cardíaco associado ao uso de EAA.

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O aumento da massa, associada ou não a disfunções sistólica e diastólica do ventrículo esquerdo (VE), pode estar relacionada ao uso de EAA, conforme demonstrado no estudo de Bagish et al (Circulation. 2017;135:1991–2002. DOI: 10.1161/CIRCULATIONAHA.116.026945).

O estudo apontou que a fração de ejeção (FE) dos pacientes em uso de esteroides anabolizantes foi de 49% contra 58% em não usuários. Quanto à análise da função diastólica, observou-se diferença significativa na média da onda E mitral, sendo menor no grupo de usuários (8,9 cm/s x 10,1 cm/s). Houve diferença significativa na massa ventricular esquerda, sendo a média do índice de massa dos usuários de EAA maior (111 g/m² x 98 g/m²).

Circulation. 2017;135:1991–2002. DOI: 10.1161/CIRCULATIONAHA.116.026945

É importante lembrar que a hipertrofia ventricular pode ocorrer como adaptação a exercícios isométricos ou de endurance, caracterizada por um espessamento parietal simétrico, distribuído homogeneamente e envolvendo todas as cavidades cardíacas. Geralmente é observado um aumento fisiológico de ambos os ventrículos (principalmente entre atletas de endurance), juntamente com uma dilatação atrial proporcional.

Apesar da hipertrofia e aumento das câmaras cardíacas, as funções sistólica e diastólica cardíaca não estão comprometidas em atletas. A diferenciação entre adaptação fisiológica e a patológica é um desafio para o ecocardiografista. Esta última situação deve ser considerada quando se identificam espessuras de parede ventricular > 13 mm em caucasianos e > 15 mm em afrodescendentes; ou hipertrofia assimétrica, o que pode ocorrer na cardiomiopatia hipertrófica, por exemplo.

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A hipertrofia concêntrica que ocorre pelos EAA geralmente não é condizente com o volume e intensidade de treinamento físico realizado, podendo estar associada a disfunções sistólica e diastólica.

A análise por speckle tracking tem sido particularmente útil para detectar disfunção ventricular subclínica por cardiotoxicidade, sobretudo quando a fração de ejeção do VE ainda está normal. A partir desta técnica, obtém-se o strain longitudinal global (SGL) do VE, que vem ganhando destaque na avaliação das função e mecânica cardíaca para a identificação da cardiotoxicidade em usuários de EAA.

A correlação entre valores reduzidos de SGL do VE e o uso de EAA tem sido demonstrada em estudos recentes, mesmo após a descontinuação dos esteroides anabolizantes, com nítida associação entre quantidade e tempo de uso na determinação da lesão cardíaca.

O trabalho miocárdico é uma nova ferramenta da ecocardiografia e incorpora a pós-carga ventricular esquerda na análise do SGL. O trabalho miocárdico se correlacionar com o consumo de oxigênio miocárdico, e a eficiência do trabalho também pode ser avaliada. Esta análise pode ser muito útil no acompanhamento de usuários de EAA, além de fornecer evidências adicionais sobre a presença de remodelamento patológico.

O ventrículo direito (VD) também pode apresentar disfunção sistólica decorrente do uso de EAA. Kasikcioglu et al. identificaram disfunção ventricular direita em seu estudo que mostrou resultados semelhantes ao efeito dos EAA na função do VE.

Androgenic anabolic steroids also impair right ventricular function Kasikcioglu, Erdem et al. International Journal of Cardiology, Volume 134, Issue 1, 123 – 125

Alizade et al. demonstraram que, apesar da função sistólica normal do VD, avaliada por parâmetros convencionais da ecocardiografia, os parâmetros de strain estavam diminuídos em usuários de EAA em comparação com não usuários.

Na análise da função diastólica do VE, além dos parâmetros convencionais já descritos, a avaliação do strain do átrio esquerdo (AE) pode ser utilizada para acompanhar os usuários de EAA. Valores reduzidos do strain longitudinal da fase de reservatório do AE são descritos em estudos, tendo como objetivo a identificação de alterações na função diastólica nesse perfil de pacientes de modo precoce.

Outros métodos são citados no artigo. A angiotomografia (AngioTC) de artérias coronárias, no contexto de usuários de EAA, se torna particularmente relevante devido aos efeitos adversos potenciais desses compostos sobre o sistema cardiovascular, permitindo identificar precocemente lesões ateroscleróticas.

Souza e colaboradores estudaram a atenuação de gordura pericoronária (AGp) – técnica que permite predizer a inflamação vascular mesmo antes da formação da doença aterosclerótica – e o perfil inflamatório em usuários de EAA (UEAA), comparando com não usuários (NUEAA) e com sedentários (CS). Foi evidenciado maior acometimento de AGp da artéria coronária descendente anterior e da coronária direita no grupo UEAA, bem como maiores níveis de IL-1, IL-6 e IL-10. Esses achados reforçam o estado inflamatório e a tendência à formação de placas ateromatosas em usuários de esteroides anabolizantes, bem como destacam novos marcadores para o manejo desse tipo de paciente.

A ressonância magnética cardíaca (RMC), por sua vez, pode identificar hipertrofia ventricular esquerda (HVE) e aumento da massa ventricular, que são comuns em usuários de EAA.  Além disso, a RMC pode reconhecer indicativos de comprometimento funcional, detectando disfunções sistólicas e diastólicas, como redução da fração de ejeção do ventrículo direito e diminuição do strain longitudinal do ventrículo esquerdo.

A presença de fibrose miocárdica, contudo, não costuma ser um achado comum em usuários de EAA.

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