A avaliação da geometria do anel valvar mitral é passo crucial para a programação do implante valvar transcateter (TMVI – transcatheter mitral valve implantation) e muitos pacientes são excluídos desta possibilidade terapêutica em razão da desproporção entre diâmetro anular e os dispositivos atualmente disponíveis.
Para esta avaliação, a tomografia computadorizada (TC) cardíaca é considerada a modalidade de imagem de escolha, contudo é um método que requer uso de contraste intravenoso e expõe os pacientes à radiação.
Para minimizar essa exposição, alguns estudos analisaram o papel da ecocardiografia transesofágica tridimensional neste contexto. Apesar de muito útil e efetivo, não deixa de ser um exame invasivo.
Desta fora, seria então a ecocardiografia transtorácica (ECOTT) 3D factível para esta análise? Um estudo (Peters M, et al., Screening for Transcatheter Interventions
by Echocardiography: A Comparison of 3D Mitral Annulus Quantification in Transthoracic Echocardiography and Cardiac Computed Tomography, Journal of the American Society of Echocardiography -2024) comparou os achados do ECOTT 3D com os da TC para tentar nos responder a este questionamento.
Foram avaliados 65 pacientes que realizaram TC para avaliação cardíaca estrutural por diferentes motivos, a citar doença valvar aórtica, fibrilação atrial e doença valvar mitral.
Esses mesmos pacientes, então, realizaram estudo ecocardiográfico transtorácico com análise 3D (GE Vivid E95 – transdutor 4Vc-D) e as janelas apicais foram utilizadas para a reconstrução tridimensional através de software próprio para avaliação mitral (4D Auto MVQ, GE).
As medidas da TC utilizadas foram (1) área valvar mitral, (2) perímetro mitral, (3) distância intercomissural – IC e (4) distância anteroposterior – AP.
A análise foi direcionada para determinar o ponto de corte ideal, da avaliação ecocardiográfica, para predizer um perímetro do anel valvar mitral > 134 mm, que corresponde o critério tomográfico de exclusão para o implante valvar transcateter (tamanho do maior dispositivo disponível na instituição onde o estudo foi realizado – Medtronic Intrepid TMVI).
A idade média dos pacientes avaliados por de 78.2 ± 7.3 anos, sendo 37% mulheres. As medidas médias foram uniformemente maiores na TC quando comparadas com as medidas pelo ECO TT 3D:
- Área valvar = 10.0 ± 2.8 vs 8.9 ± 2.2 cm2 , p < .001;
- Perímetro anular = 117.8 ± 16.0 vs 106.6 ± 13.01 mm, p < .001;
- Distância intercomissural = 38.7 ± 5.9 vs 32.7 ± 4.6 mm, p < .001.
A distância do diâmetro anteroposterior do anel valvar não apresentou diferença significativa entre os dois métodos (31.0 ± 4.9 vs 30.3 ± 3.6 mm, p = 0.208).
Houve uma forte correlação entre as medidas realizadas através do ECOTT 3D e da TC na análise da área valvar mitral (r = 0.71) e perímetro anular (r = 0.73).
Para as medidas das distâncias anteroposterior (r = 0.57) e intercomissural (r = 0.62) essa correlação foi moderada.
Dos pacientes avaliados, 10 (15%) apresentaram um perímetro anular > 134 mm pela TC e, neste caso, um ponto de corte de 115 mm para o valor desta medida pelo ECOTT 3D foi considerado como preditor com 100% de sensibilidade e 84% de especificidade (AUC = 0.96).
Os resultados demonstram, segundo os autores, uma correlação bastante significativa entre os dois métodos para a análise da área valvar mitral e do perímetro anular, bem como das distâncias intercomissural e anteroposterior.
A diferença das medidas (medidas pela TC > medidas pelo ECOTT 3D) pode ser justificada pela diferença da técnica de cada modalidade para a aferição de estruturas semelhantes. Além disso, a TC consegue avaliar de forma superior os pontos de coaptação dos folhetos valvares.
Portanto, o estudo conclui que a medida do perímetro anular, através do ECOTT 3D, com ponto de corte de 115 mm tem potencial para ser utilizado no rastreio de pacientes elegíveis para o implante valvar mitral transcateter.
Graduado em medicina pela Universidade Potiguar (UnP). Possui residência em Clínica Médica, pelo Hospital Universitário Onofre Lopes – HUOL (UFRN), e em Cardiologia, pelo Procape – UPE. Porta o título de especialista em Cardiologia, pela Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC). E é pós-graduado em Ecocardiografia, pela ECOPE.