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Agenesia do Apêndice Atrial Esquerdo: um raro achado ecocardiográfico

O apêndice atrial esquerdo (AAE) tem papel importante nos pacientes com fibrilação atrial (FA). Apesar de sua função fisiológica não ser muito bem entendida*, sabe-se que o AAE pode ser foco de arritmias e, principalmente, origem de tromboembolismo.

* Funciona como uma câmara de descompressão durante a sístole ventricular esquerda e em condições de pressão atrial esquerda elevada. Sua complacência é maior que a do restante do átrio, e, por isso, é capaz de modular a pressão na câmara, compensando sobrecargas de volume e aumentos de pressão. Além disso, o apêndice possui a maior concentração de grânulos de peptídeo natriurético atrial (PNA).

A ecocardiografia transesofágica, nesse contexto, é a modalidade de imagem frequentemente utilizada para documentar/excluir trombo no interior da AAE, sobretudo antes da realização de cardioversão.

A visualização, de forma apropriada, do AAE, mesmo em caso de exclusão prévia, é parte importante desta avaliação. Para tal, se faz necessário o entendimento diferentes variáveis anatômicas dessa estrutura cardíaca, sejam eles consideradas como normais ou secundárias à abordagem invasiva prévia (ver exemplos a seguir – vídeos retirados de https://doi.org/10.1016/j.case.2023.01.003).

https://blog.escolaecope.com.br/wp-content/uploads/2023/07/normal-vs-oclusao-percutanea-1-1.mp4
normal (esquerda) x oclusão percutânea do AAE (direita)
https://blog.escolaecope.com.br/wp-content/uploads/2023/07/normal-vs-clipagem-cirurgica.mp4
normal (esquerda) x clipagem cirúrgica (direita)
https://blog.escolaecope.com.br/wp-content/uploads/2023/07/normal-vs-cirurgica-com-trombo.mp4
normal (esquerda) x clipagem cirúrgico com trombo (direita)

Aqui no blog já falamos sobre uma condição incomum que é o aneurisma do AAE. Agora vamos para o outro extremo e falar, de forma objetiva, sobre a ausência (agenesia) congênita do AAE.

A ausência do AAE na sua localização anatômica habitual pode ser decorrente de três diferentes possibilidades: (1) dextroposição do AAE, por deslocamento congênito, o posicionando no átrio direito (à direita, entre o apêndice atrial direito e aorta ascendente); (2) inversão espontânea, como complicação rara de cirurgia cardíaca (por utilização do bypass cardiopulmonar por aplicação à vácuo), suspeitado na presença de uma nova massa no átrio esquerdo observada pela ecocardiografia transoperatória; (3) agenesia congênita do AAE.

A agenesia do AAE é condição rara, com poucos casos relatados na literatura e que se associa a outras alterações congênitas em até 20% dos casos. Dada sua baixa incidência, normalmente é necessária a complementação com outro método diagnóstico para uma definição diagnóstica.

https://blog.escolaecope.com.br/wp-content/uploads/2023/07/TC-AAE.mp4
Tomografia computadorizada: esquerda – AAE em posição habitual; direita – ausência de AAE.

Vamos mostrar como isso pode acontecer na prática? Trago aqui um relato de caso do periódico CASE (Arguelles et al, Congenital Absence of the Left Atrial Appendage: Role of Multimodality Imaging, Cardiovascular Imaging Case Reports Volume 7 Number 6).

Paciente de 57 anos de idade, com FA paroxística (CHADS-VASC 4) admitido no pronto socorro com palpitação taquicárdica associada a dispneia. Tinha histórico de miocardiopatia hipertrófica com implante de cardiodesfibrilador (CDI) por arritmia ventricular documentada.

Radiografia de tórax demonstrou congestão pulmonar leve e eletrocardiograma, FA de alta resposta ventricular (FC 137 bpm).

Foi indicado cardioversão elétrica sincronizada e solicitado ecocardiograma transesofágico pré procedimento para avaliar presença de trombo intracavitário.

Durante o exame não foi possível visualizar o AAE em sua topografia habitual.

CS – seio coronário; LCX – artéria circunflexa; LV – ventrículo esquerdo; LA – átrio esquerdo; MV – valva mitral; seta – ausência de AAE

A reconstrução 3D do AE também falhou em demonstrar o AAE.

https://blog.escolaecope.com.br/wp-content/uploads/2023/07/video-1-AUSENCIA-AAE.mp4
Ausência de AAE (*)

Considerando que o paciente não tinha histórico de cirurgia cardíaca aberta ou de oclusão percutânea, foram cogitadas as seguintes hipóteses: (1) hipoplasia ou agenesia do AAE; (2) AAE completamente trombosado e (3) topografia não habitual do AAE.

Foi, então, realizado com tomografia computadorizada com contraste, que confirmou a ausência do AAE, com achado adicional de origem anômala do coronária direita a partir do folheto coronariano esquerdo com trajeto interatrial.

AscAo, Ascending thoracic aortaGCVgreat cardiac veinLADleft anterior descending coronary arteryLCx, left circumflex coronary artery; LLPV, left lower pulmonary veinLUPV, left upper pulmonary vein; LVleft ventricleRUPV, right upper pulmonary vein.
An.RCA, Anomalous right coronary artery; AscAo, ascending thoracic aortaLCC, Left coronary cusp; LMAleft main coronary arteryNCC, noncoronary cusp; RAright atrium

Após a confirmação diagnóstica de ausência congênita de AAE, o paciente realizou cardioversão elétrica sincronizada, sem complicações, com reversão para ritmo sinusal e niciou heparina intravenosa como ponte para anticoagulação oral com rivaroxabana.

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