Parâmetros de Avaliação da Função Diastólica: revisão (Parte II)

Continuação …

Velocidade de propagação (modo M em cores): estima a propagação espacial-temporal do fluxo diastólico inicial e sua velocidade. Mede o tempo transcorrido pelo fluxo desde o anel mitral (T1) até o ápice do VE (T2), sendo influenciada pela queda da pressão intraventricular durante o período de relaxamento isovolumétrico (constante τ).

Quando normatizada com a velocidade da onda E mitral, em pacientes com disfunção ventricular, permite calcular a pressão do AE. Em pacientes com hipertrofia ventricular importante, função sistólica preservada e alteração do relaxamento ventricular, a velocidade de propagação (Vp) encontra-se normal.

A Vp deve ser obtida desde a posição apical, posicionando o setor de Doppler em cores na via de entrada do VE, alinhado com o fluxo diastólico transmitral. Diminuindo a escala da cor para obter um fenômeno de “aliasing”, destinado a facilitar a medida da velocidade da rampa de enchimento, aciona-se o modo M. Para realizar a medição de forma mais precisa, aumenta-se a velocidade de varredura.

Velocidade de propagação do fluxo mitral obtido desde a posição apical de 4 câmaras. Posiciona-se o setor do Doppler em cores de maneira a registrar o fluxo desde o plano da valva mitral (T1) até a ponta do VE (T2). Acionando-se o modo M em cores, com a escala de cor mais baixa, para permitir aparecimento de “aliasing”, mede-se a inclinação da rampa, expressa em velocidade (cm/s) – Acervo Prof. Castillo

Em condições normais o enchimento diastólico inicial resulta em aumento progressivo do gradiente entre o AE e o VE, que se estende até a ponta do VE. Quando há disfunção diastólica, a magnitude desse gradiente diminui e não alcança a ponta do VE. Assim, o tempo transcorrido entre T1 e T2 aumenta diminuindo a inclinação da rampa. Observa-se, também, uma desaceleração da propagação (ponto de inflexão) tanto mais perto do plano mitral quanto maior o grau de disfunção diastólica.

Velocidade de propagação (Vp) em indivíduo sem disfunção diastólica (esquerda) e com disfunção diastólica (direita) onde se observa a velocidade da rampa de propagação e o ponto de inflexão da velocidade – Acervo Prof Castillo

Em pacientes com disfunção ventricular esquerda com fração de ejeção inferior a 40% a relação entre a velocidade da onda E mitral e a velocidade de propagação do fluxo permite estimar a pressão de enchimento ventricular (pressão capilar pulmonar), utilizando a equação conhecida como fórmula de Garcia:

Pressão Capilar pulmonar = 5,7 . (E/Vp) + 4,6

Intervalo de tempo E-e’ (TE-e’): a velocidade da onda e’ do anel mitral medido pelo Doppler tecidual apresenta dependência da carga na ausência de doença cardíaca, podendo resultar em interpretações errôneas sobre o relaxamento ventricular em indivíduos normais com pressões do AE reduzidas. O início da onda e’ em relação ao início do influxo mitral (onda E) ocorre simultaneamente em indivíduos normais e após o início da onda E nas cardiomiopatias restritivas.

A principal dificuldade para sua obtenção consiste na aquisição dos traçados do fluxo mitral e do Doppler tecidual em intervalos R-R iguais ou utilizando registro simultâneo no mesmo batimento, o que necessita de equipamentos com Doppler dual.

Em estudo com registro no mesmo batimento, pacientes com pressão de enchimento ventricular normal determinada por cateterismo apresentaram TE-e’de 5±8 ms e, em pacientes com aumento da pressão de enchimento o valor encontrado foi de 18±18 ms. O aumento do intervalo TE-e’ está relacionado à abertura precoce da valva mitral quando há elevação da pressão de enchimento.

Em casos em que não é possível o registro Doppler simultâneo, em intervalos R-R similares, pode-se medir o tempo entre a onda R do ECG e o início do influxo mitral e o início da onda e’ do Doppler tecidual e estabelecer a diferença entre os mesmos.

Obtenção do intervalo TE-e’ em indivíduo normal (esquerda) e em paciente com disfunção diastólica (direita) – Acervo Prof. Castillo

Strain rate diastólico da onda E (SRE) e do intervalo de relaxamento isovolumétrico (SRTRIV): O strain rate longitudinal diastólico correlaciona-se com a disfunção diastólica do VE, sendo sensível para detectar alteração do relaxamento e aumento da pressão de enchimento do VE. O SRTRIV obtido após o fechamento da valva aórtica, em estudo realizado simultâneo com cateterismo cardíaco, apresentou boa correlação com o aumento da pressão diastólica do VE.

O strain rate da onda E também tem sido útil na detecção de disfunção diastólica em pacientes com e sem disfunção sistólica do VE.

Embora não existam valores de referência, estudos preliminares mostram sensibilidade semelhante à relação entre a velocidade E mitral e a velocidade e’ do Doppler tecidual (relação E/e’) para detectar disfunção diastólica em pacientes com função sistólica normal ou discretamente diminuída.

Strain rate longitudinal diastólico obtido em dois equipamentos diferentes. Durante a diástole, após o fechamento da valva aórtica (AVC) é obtido o strain rate do tempo de relaxamento isovolumétrico (SRTRIV). No pico da onda E é obtido o strain rate diastólico da onda E (SRE). Observa-se, também, o strain rate sistólico do VE – Acervo Prof. Castillo

Os valores encontrados para o SRTRIV foram 0,44 s-1 (variação de 0,29 a 0,56 s-1) em indivíduos normais e 0,27 s-1 (variação de 0,12 a 0,39 s-1) em pacientes com disfunção diastólica e FE normal. Os valores encontrados para o SRE foram 0,99 s-1 (variação de 0,79 a 1,18 s-1) para indivíduos normais e 0,82 s-1 (variação de 0,61 a 0,97 s-1) para pacientes com disfunção diastólica.

Em análise de 189 indivíduos saudáveis encontramos o valor de 1,40±0,22 s-1 e em 149 pacientes com diversos graus de disfunção diastólica encontramos os valores de 0,87±0,29 s-1 nos pacientes alteração do relaxamento, 0,79±0,25 s-1 na disfunção diastólica pseudonormal e 0,67±0,25 s-1 nos pacientes com disfunção diastólica restritiva.

Strain longitudinal do átrio esquerdo: o strain de reservatório, ou strain máximo do átrio esquerdo, pode ser utilizado para complementar o diagnóstico da função diastólica, visto que o enchimento ventricular é regulado pelo AE através de suas funções de reservatório, conduto e bomba.

Strain longitudinal do átrio esquerdo obtido em dois equipamentos com sistema de análise automatizada. À esquerda, análise com o software Tomtec® e à direita, análise com o software Echopac 204® – Acervo Prof. Castillo

A diminuição do strain de reservatório correlaciona-se com o aumento da pressão e volume do AE sendo útil na identificação da disfunção diastólica com aumento da pressão do AE. Na Tabela 11 encontram-se os valores do strain longitudinal de reservatório do AE em indivíduos normais e em pacientes com diversos graus de disfunção diastólica.

Acervo Prof. Castillo

A nova recomendação de 2025 fala em strain do AE (reservatório) ≤ 18%.

Nagueh et al., Journal of the American Society of Echocardiography, July 2025
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